Se não houvesse pecado no mundo, não haveria necessidade de sacerdote. Porque o sacerdócio foi instituído por Deus, para interceder em favor da aceitação dos pecadores por Ele.
De igual modo, não haveria também necessidade de sacrifício com derramamento de sangue, porque sem o sangue, o sacerdote não teria o que oferecer a Deus para que fosse coberto o pecado daqueles em favor dos quais ele deveria interceder. Efetivamente, permanece culpado diante de Deus, todo aquele que não tiver a cobertura do seu pecado pelo sangue de Jesus, e que não esteja portanto debaixo da eficácia da sua intercessão sacerdotal, porque todos são pecadores, e somente podem ser resgatados da condenação eterna por meio da fé em Jesus Cristo.
Assim, foram dados a Israel tanto um sistema sacerdotal, quanto sacrificial, para servir de testemunho a todo o mundo, em todas as épocas, que a expiação do pecado demandaria tanto o exercício do sacerdócio, quanto da apresentação de sacrifícios cruentos como oferta pelo pecado. Isto tinha o propósito pedagógico, na lei, de nos conduzir à aceitação de Cristo, como o sacerdote e o sacrifício que efetivamente pode remover o pecado.
É sobre esta questão que o autor de Hebreus trata em toda a sua epístola, e especialmente neste capítulo e nos dois seguintes ao mesmo.
Ele havia demonstrado no capítulo anterior que Jesus não era sacerdote num tabernáculo terreno, mas que realiza o Seu ofício sacerdotal eterno no tabernáculo celestial, no qual penetrou como precursor de todos os cristãos, aos quais tornou também sacerdócio real para Deus.
O sacerdócio arônico, ou seja segundo a descendência de Arão, era uma sombra, uma figura deste sacerdócio eterno de Cristo com os cristãos.
Melquisedeque era rei e sacerdote e nisto era um tipo do reinado e do ofício sacerdotal eterno de Cristo.
E era rei da cidade de Salém, que significa paz, indicando que Jesus seria o Príncipe da paz. O nome Melquisedeque, significa no hebraico, rei de justiça, indicando que o reino de Jesus é de justiça. Como houve mudança de sacerdócio com a Nova Aliança, então este novo sacerdócio de Cristo deveria estar debaixo de uma nova administração e regulamentação, com regras próprias para o seu funcionamento.
Daí se afirmar no verso 12 que quando se muda a ordem do sacerdócio, há necessariamente também mudança de Lei. Ou seja, as bases da ministração deste sumo-sacerdote eterno que é Cristo, não são as constantes para os sacerdotes que oficiavam debaixo da Antiga Aliança, segundo as prescrições para os sacerdotes previstas na Lei de Moisés, que deveriam apresentar sacrifícios de animais, para a expiação do pecado.
O ensino deste sumo-sacerdote da Nova Aliança requer uma justiça dos aliançados que exceda em muito a que era requerida no Velho Testamento.
Por isso eles devem ser justificados pela graça, mediante a fé, para receberem a nova vida e natureza do Espírito Santo, de tal modo que vivam debaixo da direção, instrução e poder do Espírito, para que vivam em amor tanto em relação a Deus, quanto aos seus irmãos na fé. Eles devem permanecer ligados em espírito ao seu sumo-sacerdote, que é Cristo, por se auto-negarem, por crucificarem o ego pelo carregar diário da cruz, e por uma estrita obediência e submissão a Cristo, seguindo-O em toda e qualquer circunstância.
Quando se diz que o sacerdócio de nosso Senhor é da ordem de Melquisedeque, não quer isto significar que Jesus é da descendência de Melquisedeque, mas que o seu sumo-sacerdócio seria do mesmo tipo de Melquisedeque, que não era transmitido por descendência carnal, como era o caso dos sacerdotes segundo a ordem de Arão, da tribo de Levi. Esta mudança estava prevista nos planos de Deus porque o sacerdócio da primeira aliança não podia garantir a salvação e o aperfeiçoamento em santidade de ninguém, mas Cristo como Sumo Sacerdote, opera e garante tanto uma coisa quanto outra, para aqueles em favor dos quais intercede.
A Sua intercessão é operante e eficaz na transformação e confirmação das vidas daqueles que lhes dirigem suas petições, porque Ele não foi chamado para ocupar este ofício pelo Pai, através de direito de descendência natural, conforme ocorria com os sacerdotes da Antiga Aliança, mas segundo a virtude da sua vida incorruptível, a saber, que é eterna, e que não pode passar, o que não ocorria com os sacerdotes do antigo pacto que eram impedidos de permanecerem no seu ofício por causa da morte.
Aqueles sacerdotes deveriam ser em grande número em razão de serem apenas homens mortais. Mas Jesus é o fiador de uma melhor aliança com melhores promessas porque permanece para sempre e tem um sacerdócio eterno. Desta forma ele pode salvar perfeitamente aqueles que se achegam a Deus, e vive eternamente para interceder por eles. Além disso ele não era pecador como os demais sacerdotes. Ele era santo, inocente, imaculado, e mais sublime do que os próprios céus, que é também criação de Deus Pai, de Cristo e do Espírito Santo, de maneira que não foi gerado dentre os pecadores. Não necessitava como os sumos sacerdotes do antigo pacto oferecer sacrifícios pelos Seus próprios pecados, como era o caso deles, porque Ele não tinha qualquer pecado.
E ainda, não necessitou apresentar várias ofertas continuamente como eles estavam obrigados a fazer, porque apresentou a Si mesmo como sacrifício por uma única vez, para ser tanto o Sacrifício como o Sacerdote pelos quais podemos ser perdoados de nossos pecados e nos tornarmos aceitáveis a Deus.
Os sacerdotes do Antigo Pacto eram homens fracos, imperfeitos, e eram constituídos em seus ofícios pela Lei de Moisés, mas Jesus foi constituído sumo sacerdote por uma palavra de juramento feita pelo Pai de que seria sacerdote para sempre (Sl 110.4). Por causa de Cristo, a dispensação da graça é mais espiritual e eficaz que a dispensação da Lei, porque ninguém poderia ser salvo e aperfeiçoado pelos sacerdotes do Antigo Pacto, mas Cristo é poderoso tanto para salvar quanto para santificar o Seu povo.
Além disso, se aquela aliança foi temporária e revogada, a Nova Aliança que temos com Cristo é segura e eterna. Em face destes argumentos, os cristãos hebreus não tinham porque continuarem dando maior valor aos sacerdotes da Antiga Aliança, do que a Cristo como sumo sacerdote eterno deles.
Todavia, para se ter a Cristo como sacerdote, é necessário ter fé nEle, de modo que nenhum israelita jamais foi ou poderá ser justificado, por meio da Lei de Moisés, e isto se aplica a qualquer pessoa, de qualquer nação, porque a salvação é operada somente pela fé em Cristo, em nossa associação com Ele, e por nada mais.