“Viu o Senhor que a maldade do homem se havia multiplicado na terra e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração;” (Gênesis 6.5)
Nossa natureza terrena corrompida pelo pecado nos acompanhará até o dia da nossa morte – esta natureza está sempre disposta e inclinada para o mal – por isso não fazemos continuamente o bem que queremos, e fazemos continuamente o mal que não queremos – continuamente, não como sendo ininterrupto, mas como algo que sempre se manifestará de modo intermitente em todas as pessoas, ainda que mais em alguns do que em outros.
Esta continuidade é definida pela nossa incapacidade absoluta de permanecer na prática do bem em todo o tempo, por todos os dias de nossas vidas, porque assim como a força da gravidade puxa todas as coisas naturalmente para baixo, nossa natureza corrompida pelo pecado é dotada de hábitos, desejos, inclinações e disposições que sempre nos puxam para baixo, e é impossível, portanto, permanecer praticando, pensando, imaginando, sentindo e desejando somente aquilo que esteja de acordo com a vontade de Deus e seus mandamentos.
E isto se aplica também a cristãos, que são renascidos do Espírito Santo, e que são dotados portanto de uma nova natureza espiritual, celestial e divina.
É comum se pensar que as pessoas que são muito espirituais e que são notórias em sua santificação cotidiana, estão livres dessa condição de miséria da natureza terrena da qual todos somos dotados.
Ao contrário, quanto mais santificado alguém for, mais conhecerá a profundidade da malignidade da natureza terrena, em seu próprio coração, e saberá o quanto Jesus é o seu tudo para tudo, o único salvador e libertador da condenação eterna, pois por mais santos que sejamos estamos sempre carregados de pecados – pecados que são até mesmo involuntários porque a natureza terrena pulsa involuntariamente assim como o nosso coração de carne – não estando portanto sujeita até mesmo ao exercício da nossa vontade para não produzir o que seja pecaminoso, pois tal natureza possui as suas peculiares e inerentes inclinações, disposições e hábitos, que são sempre contrários à Lei de Deus e à sua vontade – em suma, em nós mesmos estamos perdidos, carregados de pecados diários e contínuos – esta é uma fonte amarga que pode ser interrompida pela fonte da nova natureza divina recebida na conversão, mas é impossível parar de todo o seu fluxo, de modo que sempre se verá na nossa água cristalina da nova natureza espiritual algo da insalubridade da fonte da natureza terrena – enquanto na comunhão com Cristo o coração está purificado de todo pecado e injustiça – mas qualquer brecha na comunhão e logo a velha natureza se levanta e nos conduz àquele estado ruim de alma que nos incapacita a viver de modo agradável a Deus – é fácil então concluir porque é a Cristo que deve ser dada toda a glória, honra e louvor.
“20 E dizia: O que sai do homem, isso é o que o contamina.
21 Porque de dentro, do coração dos homens, é que procedem os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios,
22 a avareza, as malícias, o dolo, a lascívia, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura.
23 Ora, todos estes males vêm de dentro e contaminam o homem.” (Marcos 7.20-23)
“Sem mim nada podeis fazer”, o Senhor Jesus afirma de forma incisiva e clara a nossa completa dependência dEle para sermos justificados, perdoados, regenerados, santificados e por fim glorificados, pois não há quem não peque, como temos demonstrado em razão da natureza que carregamos e que nos leva a clamar juntamente com o apóstolo Paulo: “miserável homem que sou, quem me livrará do corpo dessa morte?”. E respondemos também imediatamente com ele: “Graças a Deus por nosso Senhor Jesus Cristo”.
À luz destas considerações somos levados a concluir que quando nosso Senhor dizia a algumas pessoas logo depois que as salvava por causa da fé nele – “vai e não peques mais” – o significado deste “não peques mais” corresponde a dizer em outras palavras: “tenha por alvo não dar acolhida ao pecado e não ceder à tentação, daqui por diante. Mantenha-se em guarda, seja vigilante e ore incessantemente”; pois, mesmo depois de salvo, nenhum cristão possui em si mesmo o poder de jamais voltar a pecar, e daí dizer o apóstolo João que se dissermos que não temos pecado, mentimos. Mas o mesmo apóstolo nos ordena, segundo é a vontade de Cristo, a não vivermos mais pecando, ao contrário, devemos lutar contra os nossos pecado e confessá-los a Deus para sermos perdoados e purificados.
Ou seja, não devemos ter uma atitude de impassibilidade diante da fraqueza da nossa natureza terrena (que Jesus chamou de carne fraca), mas devemos mortificá-la por um constante andar no Espírito, sabendo que há em nós esta inclinação natural que é continuamente má, e que pode ser subjugada somente pela nova inclinação espiritual recebida na conversão a Cristo.
Pr Silvio Dutra