Dispõe-te, vai à grande cidade de Nínive e clama contra ela,…Jonas se dispôs, mas para fugir da presença do Senhor, para Társis;…
(Jn 1.2a, 3a)
Geralmente quando se fala do livro de Jonas, destaca-se a desobediência e a fuga de um profeta de Deus. Algumas revistas infantis de EBD resumem a mensagem desse livro com uma frase do tipo: Jonas, o profeta fujão, ou Jonas, o profeta desobediente. Mas, apesar de destacar a desobediência e a rebeldia de um homem de Deus, o livro Jonas registra mais atitudes de obediência do que de desobediência, de submissão à ordem do Criador do que de rebeldia. De sorte que podemos afirmar que o livro do profeta desobediente é o livro da obediência. O livro do profeta rebelde é o livro da submissão à vontade de Deus.
No livro de Jonas toda a criação se submete e segue as ordens do Criador: O vento forte (1.4), o mar agitado (1.12, 15), o grande peixe (1.17; 2.10), a planta (4.6), o minúsculo inseto (4.7), o vento quente e calmo (4.8). Há nesse livro uma sintonia quase perfeita entre Criador e criatura, entre ordem e obediência, entre determinação e submissão. É uma sintonia quase perfeita porque um único ser em toda a criação resolve opor-se e rebelar-se contra a ordem do Criador. Toda a criação se submete, exceto o homem.
Amados, por incrível que pareça, nós seres humanos, entre todas as criaturas, podemos nos tornar um fator complicador no cumprimento da Missão de Deus. Isso acontece quando resolvemos andar na direção contrária ao propósito de Deus neste mundo. À semelhança de Jonas, às vezes, queremos mudar a mente de Deus, os seus métodos e a sua maneira de agir ao invés de mudarmos o nosso coração. Há momentos em que cometemos a insensatez de querermos dizer para Deus o lugar, o tempo e as pessoas que devem ser evangelizadas. Mas, isso é rebeldia! Ele já disse que o lugar é “todo lugar”, que o tempo é “em todo o tempo”, e que as pessoas, é “toda criatura”.
Irmãos, Missões é uma questão de obediência. Mesmo com esse ato de rebeldia, Deus mostrou a Jonas quem de fato manda! Quem de fato é o Senhor! Meio que a contra gosto ele obedeceu, e o resultado de sua obediência foi impressionante. Houve uma conversão em massa! Sua mensagem, apesar de dura e sem compaixão, teve cem por cento de aproveitamento (3.5-10). A experiência de Jonas nos ensina que o que Deus requer de nós, os seus servos, é tão somente obediência; o resultado do trabalho é da competência Dele.
Quando eu viajava de São Gabriel para a aldeia, passava em frente ao Batalhão de Infantaria de Selva. Ao passar ali me deparava com uma frase escrita em grandes letras: “Missão não se escolhe nem se discute, cumpre-se.” Alguém pode até pensar que isso é coisa de militar, e de fato é. Mas, não compete a nós, servos do Senhor Jesus, escolhermos ou discutirmos a missão que Ele nos confiou; compete-nos tão somente obedecer. Precisamos levar em consideração que aquele que disse “fazei discípulos de todas as nações/etnias” (Mt 28.19b), foi o mesmo que um pouquinho antes declarou ser a Maior Autoridade do Universo: “Toda autoridade me foi dada no céu e na terra” (Mt 28.18b). Por tanto, obedeçamos e deixemos os resultados por conta Dele.
Missões: uma questão de compaixão
Por isso, me adiantei, fugindo para Társis, pois sabia que és Deus clemente, misericordioso, tardio em irar-se, grande em benignidade, e que te arrependes do mal. (Jn 4.2b)
Quando se fala da fuga de Jonas procura-se explicar as razões e os motivos que o levaram a fugir ao invés de obedecer a Deus. Geralmente atribuem a sua fuga ao seu etnocentrismo, ou seja, ao seu entendimento que Javé era o Deus exclusivo dos israelitas. Além de ao seu sentimento de exclusividade, atribuem a sua fuga também ao conhecimento que ele tinha da maldade, da cruel e do tratamento desumano que os ninivitas dispensavam aos seus inimigos. Possivelmente esses dois fatores contribuíram para que Jonas fugisse para o Oeste (Társis) ao passo que o Senhor o enviara para o Leste (Nínive).
No entanto, o real e verdadeiro motivo da sua fuga e desobediência foi revelado por ele mesmo em sua desgostosa oração. Ao ver a conversão dos ninivitas e o perdão de Deus sobre suas vidas, Jonas ficou irado e desgostoso com o Senhor. Com essa sua atitude Jonas tornou-se o único profeta-missionário que se entristeceu com a conversão dos seus ouvintes. Mas, por que essa atitude tão mesquinha? Em sua oração Jonas revelou o que estava por trás da sua fuga e de sua estranha reação à conversão dos ninivitas. Ele disse: Eu fugi porque conhecia o teu caráter misericordioso,…fugi porque eu sabia que tu és Deus clemente, benigno, tardio em irar-se e que te arrependes do mal (4.2b). Jonas queria tudo, menos que Deus usasse de misericórdia e compaixão com os ninivitas. Jonas era um profeta destituído de compaixão. Ele pregava desejando a condenação e não a salvação dos pecadores; ele pregava querendo ver a justiça de Deus sendo executada e não o seu amor sendo demonstrado; ele pregava desejando ver o juízo de Deus sobre as pessoas, e não o seu perdão. Ou seja, faltava a Jonas compaixão; e essa foi a razão maior da sua fuga.
Amados, a falta de compaixão transforma a obediência num fardo pesado, nos torna pessoas mal humoradas, carrancudas e severas no tratamento dos pecados alheios. A ausência de compaixão em nossos corações nos torna pessoas incapazes de ver gente como gente, de valorizar mais pessoas do que coisas, e de nos movermos em direção aos perdidos, aos necessitados e aos desprovidos de Deus neste mundo. Por isso, concluímos que sem compaixão não há missão. Podemos ter pessoas vocacionadas, recursos financeiros, treinamento especializado, missionários bem preparados, agências e juntas de missões, estratégias e projetos bem elaborados, e dons espirituais; mas, nada disso funcionará a contento se não houver compaixão, corações sensíveis às necessidades das pessoas, e se não formos capazes de enxergar com os olhos do coração. Seguramente, a força impulsionadora da obra missionária é a compaixão gerada pelo Espírito. É possível que a passividade, a lentidão e a falta de envolvimento de alguns no cumprimento do mandato missionário estejam relacionados com a ausência desse nobre sentimento em seus corações.
É preciso que estejamos atentos! O tempo passa, nos acostumamos com Deus, com a igreja, com atividades religiosas, com cultos semanais, e, quando menos esperamos, nos tornamos religiosos. E aí está o grande perigo! A religiosidade mata a compaixão (Lc 10.29-37)! Se isso já aconteceu com alguns de nós, peçamos ao Senhor a restauração desse sentimento. Porque missões é também uma questão de compaixão. O trabalho missionário realizado por Jesus é o nosso maior paradigma. Mateus diz que Ele percorria todas as cidades e povoados ensinando, pregando e curando. No entanto, ele revela que a força impulsionadora de sua missão era a compaixão, pois, “Vendo ele as multidões, compadeceu-se delas,…” (Mt 9.35, 36a).
Pr. Paulo César Nunes do Nascimento