Em Isaías 58, o pecado e a falsa religiosidade são denunciados com uma chamada ao arrependimento, e é feita a adição de promessas consoladoras para aqueles que se convertessem a Deus.
Especialmente o conjunto de profecias do 58º capítulo até o capítulo final do livro de Isaías (66), consiste na preparação para a chegada do reino do Messias até a sua glorificação final.
Assim o protesto contra o pecado e falsa religiosidade denunciados neste capítulo, apesar de ser também aplicável à Igreja, teve por alvo principalmente a casa de Jacó, a saber, o povo de Israel na antiga dispensação, de maneira que o profeta é convocado a tocar a trombeta de alerta e anunciar ao povo do Senhor que ele se encontrava em pecado, e que a religiosidade deles era falsa.
Importava que se arrependessem porque era o povo da aliança, através do qual o Messias se manifestaria ao mundo, para dar cumprimento ao propósito eterno de Deus, de formar através dEle um povo santo, a saber a Igreja.
O Deus de Israel não muda e o Seu propósito para aqueles que chama a estarem aliançados com Ele é o mesmo, seja para Israel na antiga aliança, seja para a Igreja de Cristo na nova.
O povo do Senhor deve ser um povo santo, e este capítulo de Isaías, não deixa nenhuma dúvida quanto a isto. O Messias veio para o povo de Israel. Foi a eles que Ele foi enviado. O evangelho deveria ser pregado primeiro aos judeus; porque o propósito de Deus de ter um povo santo seria consolidado com a redenção e os dons do Messias para a santificação do Seu povo.
A função do profeta na antiga dispensação quanto a protestar contra o pecado e a falsa religiosidade do povo do Senhor, continua sendo a mesma para os pregadores do evangelho na Igreja. Eles devem tocar a trombeta para alertá-la quanto à necessidade de um viver verdadeiramente santo, para o inteiro agrado do Senhor.
O pregador não pode lisonjear o povo do Senhor, mas denunciar o seu pecado. O povo do Senhor é um povo privilegiado, um povo honorável, um povo glorioso, mas nunca deve ser lisonjeado. Ainda que estejam reformados em muitas coisas, entretanto as suas transgressões devem ser repreendidas e abandonadas, ainda que sejam poucas, porque Deus assim o exige.
Ele não pode estar contente vendo que o seu povo está sendo vencido por qualquer tipo de pecado por motivo de estar fazendo concessões a um viver pecaminoso.
A santidade deve ser positiva, expressada num viver em boas obras aprovadas pelo Senhor. Especialmente na demonstração de um amor verdadeiro e prático ao próximo.
Nos versos 2 e 3 de Isaías 58 nós vemos que Deus declara que o Seu povo estava com uma falsa convicção de lhe estar agradando, porque afinal jejuavam, e O buscavam todos os dias, e julgavam que guardavam todos os Seus mandamentos, e que andavam nos Seus caminhos, e com isto pensavam que viviam de modo justo perante Ele.
No entanto, lhes apontou no final do verso 3 qual era o grande motivo de esconder a Sua face deles, a saber, tudo o que faziam era para os próprios interesses deles. Estavam buscando o Senhor para alcançarem a realização dos seus desejos, como todas as pessoas pagãs das demais nações faziam em relação à adoração dos seus falsos deuses. A motivação estava errada, e por consequência, o modo deles adorarem e servirem ao Senhor também estava errado.
Não era para o agrado do Senhor que eles O buscavam. Não era para serem aperfeiçoados em santidade para servirem-no melhor e ao próximo que eles o faziam, senão para atenderem aos seus próprios interesses egoístas e mesquinhos.
As obras da carne permaneciam em realce na vida dos israelitas, apesar de toda a religiosidade deles, por que a graça não pode operar num caminhar em falsidade.
As iras, contenções, violência e todas as demais obras da carne (v. 4) permaneciam lhes dominando, porque quando buscamos fazer a nossa própria vontade, quem prevalece é a carne, e não o Espírito.
Mas eles jejuavam, pensando que com isto estavam agradando ao Senhor. Entretanto não se vence a carne com práticas ascéticas.
O que eles faziam era ascetismo e não jejum. Jejum não é simplesmente deixar de comer (v. 5). Um jejum verdadeiro despertará automaticamente o amor prático ao próximo, em ações desenvolvidas para abençoá-lo, porque o amor divino é despertado naquele que dele se aproxima verdadeiramente, e que busca fazer sinceramente a Sua vontade (v. 6 e 7).
E é este viver verdadeiro em amor que traz a bênção do Senhor e a Sua recompensa à nossa vida, porque este é o modo dEle manifestar o Seu agrado com o nosso modo correto de viver (v. 8 a 14); que consiste em caminhar em humildade perante Ele reconhecendo que somos pecadores necessitados da Sua graça para podermos fazer o que Lhe é agradável.
O capítulo 58 de Isaías é um alerta poderoso para nos convencer que é muito fácil viver de maneira hipócrita diante de Deus com uma falsa religiosidade, enquanto estamos convencidos não pelo Espírito, mas pelas nossas próprias convicções de que estamos vivendo de modo agradável a Deus, quando na verdade estamos errando completamente o alvo.
Sabendo desta nossa facilidade para errar o alvo, o Senhor nos alerta na Sua palavra a avaliarmos o nosso caminhar pelas nossas motivações, pelos resultados de nossas ações, ou seja, se para nosso interesse, ou se para a Sua exclusiva glória.
Se for com o propósito correto, o Senhor mesmo acrescentará as Suas bênçãos espirituais ao nosso viver, de maneira que tenhamos a convicção de que Lhe temos agradado de fato. Ele fará que os nossos frutos espirituais sejam achados até na nossa descendência e nas gerações posteriores. E por isso seremos conhecidos como reparadores de brechas e restauradores de veredas. As gerações posteriores reedificarão ruínas porque trabalharão sobre o fundamento que lhes deixamos (v. 12).
E o Senhor fará isto para honrar o nosso trabalho diligente feito por amor a Ele e para a Sua glória.
Porque Ele tem prometido honrar os que Lhe honram. Devemos servir ao Senhor em humildade, reconhecendo que Ele faz sozinho o Seu trabalho nos usando apenas como Seus instrumentos, porque somos servos inúteis que não podem produzir por si mesmos a vida espiritual e todas as operações sobrenaturais que somente Ele pode realizar.
Sem Ele nada podemos fazer, em relação às realidades celestiais, espirituais e divinas.
Deus exige que deixemos de praticar o mal, e aprender a fazer o bem.
Porque assim agindo prometeu que traria as bênçãos citadas em Is 58.8-12:
– um verdadeiro viver na luz; cura das nossas transgressões; ter a glória do Senhor nos protegendo e abençoando por causa da nossa prática da justiça (v. 8);
– ter as orações e clamores respondidos por Deus, com a Sua própria presença, por termos deixado de ser prepotentes e arrogantes e por ter deixado o falar pecaminoso (v.9);
– dissipação de todas as trevas da nossa vida por estarmos atentos às necessidades do nosso próximo (v. 10);
– ser guiado continuamente pelo Senhor, e ser provido por Ele até mesmo em lugares áridos, recebendo dele força e vigor de tal maneira que a nossa vida será como um jardim regado e um manancial que nunca secará (v. 11);
– ser habilitado a viver a verdade de tal maneira que o nosso testemunho virá a ser um fundamento para as gerações futuras, especialmente para que possam reformar a Igreja tirando-a do erro, para que possa trilhar no caminho da verdade, formando um fundamento forte e seguro sobre o qual o povo de Deus possa edificar as suas vidas (v. 12).
Isto é muito mais do que simplesmente pregar e ensinar a doutrina correta.
É muito mais do que teologia, ou melhor dizendo, é a teologia verdadeira que é muito fácil de ser esquecida de ser praticada.
Isto não tem nada a ver com o ensino de técnicas psicológicas, ou de qualquer fundamento científico aplicado como fórmula para uma vida bem sucedida segun do a vontade do Senhor.
Isto é a verdade da Palavra de Deus apontando como um grande farol qual é o caminho para um verdadeiro viver vitorioso.
É por praticar as coisas afirmadas no 58º capítulo de Isaías, e por atender à repreensão que é dirigida por Deus contra o pecado, que a Igreja de Cristo pode contar com o seu favor.
Não basta portanto chorar pelos nossos fracassos, não basta orar pedindo a Deus que faça prosperar o nosso trabalho, é preciso viver efetivamente de modo justo e verdadeiro diante dEle, e tudo o mais será consequência disto.
Não é sendo um mero religioso que se alcança o favor de Deus, mas vivendo de maneira justa e santa, na prática da verdadeira piedade, que é sobretudo amor prático e real a Deus e ao nosso próximo.
Por isso se diz que não devemos buscar apenas o reino de Deus, mas também a justiça do reino.