Em fóruns de discussão sobre teologia, e até em algumas pregações, surge a dúvida sobre a suposta morte de um homem que estava em pecado no texto de 1 Coríntios 5.
O texto do capítulo (tradução NVI) diz:
“Por toda parte se ouve que há imoralidade entre vocês, imoralidade que não ocorre nem entre os pagãos, a ponto de alguém de vocês possuir a mulher de seu pai.
E vocês estão orgulhosos! Não deviam, porém, estar cheios de tristeza e expulsar da comunhão aquele que fez isso?
Apesar de eu não estar presente fisicamente, estou com vocês em espírito. E já condenei aquele que fez isso, como se estivesse presente.
Quando vocês estiverem reunidos em nome de nosso Senhor Jesus, estando eu com vocês em espírito, estando presente também o poder de nosso Senhor Jesus Cristo,
entreguem esse homem a Satanás, para que o corpo seja destruído, e seu espírito seja salvo no dia do Senhor.
O orgulho de vocês não é bom. Vocês não sabem que um pouco de fermento faz toda a massa ficar fermentada?
Livrem-se do fermento velho, para que sejam massa nova e sem fermento, como realmente são. Pois Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi sacrificado.
Por isso, celebremos a festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da maldade e da perversidade, mas com os pães sem fermento da sinceridade e da verdade.
Já lhes disse por carta que vocês não devem associar-se com pessoas imorais.
Com isso não me refiro aos imorais deste mundo, nem aos avarentos, aos ladrões ou aos idólatras. Se assim fosse, vocês precisariam sair deste mundo.
Mas agora estou lhes escrevendo que não devem associar-se com qualquer que, dizendo-se irmão, seja imoral, avarento, idólatra, caluniador, alcoólatra ou ladrão. Com tais pessoas vocês nem devem comer.
Pois, como haveria eu de julgar os de fora da igreja? Não devem vocês julgar os que estão dentro?
Deus julgará os de fora. ‘Expulsem esse perverso do meio de vocês’ (1 Coríntios 5.1-13)”.
Comentários na Bíblia de Estudo John MacArthur sobre o 1 Coríntios 5.5:
“Entregar” é um termo forte, empregado para sentenciar judicialmente. Ele se equipara a excomungar um cristão professo. Equivale a expulsar uma pessoa do culto e da comunhão cristãos, confiando-o ao domínio de Satanás, ao sistema do mundo. Veja nota em 1 Tm 1.20.
“Entre eles estão Himeneu e Alexandre, os quais entreguei a Satanás, para que aprendam a não blasfemar” 1 Timóteo 1.20.
Nota em 1 Tm 1.20: Himeneu e Alexandre. Himeneu é mencionado em 2Tm 2.17 em conexão com Fileto, outro falso mestre. Alexandre pode ser o inimigo da fé a que 2 Tm 4.14-15 faz referência. Nada mais se sabe acerca desses dois homens (veja nota no v. 3).
Entreguei a Satanás. Paulo expulsou os dois da igreja para acabar com a influência deles e proteger o povo de Deus. Ambos não estavam mais no ambiente da bênção de Deus, mas sob o controle de Satanás. Em alguns casos, Deus entregou os cristãos a Satanás para fins positivos, como a revelação do verdadeiro caráter da fé que os salvou, para mantê-los humildes e dependentes dele, para capacitá-los a fim de fortalecerem os outros ou para oferecerem louvor a Deus (cf. Jó 1.1-22; Mt 4.1-11; Lc 22.31-33; 2Co 12.1-10; Ap 7.9-15). Deus entrega algumas pessoas a Satanás para que sejam castigadas, como aconteceu tom o rei Saul (1Sm 16.12-16; 28.4-20), Judas (Jo 13.27) e o membro em pecado da igreja em Corinto (veja notas em 1 Co 5.7-5).
A destruição da carne. Refere-se à punição divina pelo pecado que pode resultar em enfermidade ou até mesmo na morte. Veja 1 Coríntios 11.29-32; At 5.1-11.
O espírito… salvo. A pessoa não arrependida pode sofrer grandemente sob a disciplina de Deus, porém deixará de ser uma má influência na igreja; e é mais provável é que ela seja salva debaixo desse castigo do que se tolerada e aceita na igreja.
No Dia do Senhor [Jesus]. Essa é a hora quando o Senhor voltará com as suas recompensas para o seu povo.
Veja nota em I Coríntios 1.8:
“Ele os manterá firmes até o fim, de modo que vocês serão irrepreensíveis no dia de nosso Senhor Jesus Cristo” 1 Coríntios 1:8.
Nota 1 Coríntios 1.8: no Dia de nosso Senhor Jesus Cristo. Cf. 5.5: 2 Co 1.14. Refere-se à vinda do Senhor para a sua igreja, o arrebatamento (Jo 14.1-3; 1Ts 4.13-18; Ap 3.10). Este deve ser distinguido do Dia do Senhor (1 Ts 5.2,4; 2 Ts 2.2), um termo referente ao julgamento dos ímpios (veja Introdução a Joel: Temas históricos e teológicos).
Comentários na Bíblia de Estudo de Genebra sobre 1 Coríntios 5.5:
•5.1 – possuir a mulher de seu próprio pai. O pai de tal homem pode ter morrido, ou então a mulher pode ter sido madrasta desse homem. Seja como for a relação sexual em vista era uma união incestuosa, explicitamente condenada em Lev 18.8. Embora a cultura greco-romana dos dias de Paulo tolerasse um grande leque de atividades imorais, até os gentios censuravam esse tipo de incesto.
•5.2 – andais vós ensoberbecidos.
Este versículo é a chave para entendermos a real preocupação de Paulo. O problema fundamental aqui não era o pecado daquele indivíduo, mas a falha da igreja em Corinto para abordar o pecado – de fato, o senso de orgulho deles ao tolerarem-no (v. 6). É possível que os coríntios tivessem desenvolvido uma teologia que podia acomodar tal imoralidade. Bem pelo contrário, eles tinham a responsabilidade de exercer disciplina, excluindo o ofensor (“para que fosse tirado do vosso meio”‘).
•5.3-5
Temos aqui uma passagem notadamente difícil. Embora Paulo estivesse ausente da comunidade cristã, ele afirma ter passado um julgamento profético no meio deles. O apóstolo está ordenando que a igreja exclua o ofensor da comunhão deles (“seja… entregue a Satanás”). O propósito desse julgamento era a salvação do homem, mas isso só poderia ser conseguido se suas tendências pecaminosas fossem vencidas (“para a destruição da carne”). De conformidade com certa interpretação de 2 Co 2.5-11, aquele homem arrependeu-se de seu pecado. Ver “Disciplina Eclesiástica e Excomunhão”, em Mt 18.15.
“Se alguém tem causado tristeza, não o tem causado apenas a mim, mas também, em parte, para eu não ser demasiadamente severo, a todos vocês.
A punição que lhe foi imposta pela maioria é suficiente.
Agora, pelo contrário, vocês devem perdoar-lhe e consolá-lo, para que ele não seja dominado por excessiva tristeza.
Portanto, eu lhes recomendo que reafirmem o amor que têm por ele.
Eu lhes escrevi com o propósito de saber se vocês seriam aprovados, isto é, se seriam obedientes em tudo.
Se vocês perdoam a alguém, eu também perdôo; e aquilo que perdoei, se é que havia alguma coisa para perdoar, perdoei na presença de Cristo, por amor a vocês,
a fim de que Satanás não tivesse vantagem sobre nós; pois não ignoramos as suas intenções” 2 Coríntios 2.5-11”.
Conclusão
O homem mencionado como imoral não havia morrido para que seu corpo fosse entregue a Satanás em sentido literal. O apóstolo Paulo estava repreendendo a igreja em Corinto, para que tomassem uma medida disciplinar contra ele, mas também, para que não se mantivessem no erro por orgulho, antes, reconhecessem que havia algo a ser corrigido.
A passagem em 2 Coríntios 2.5-11 indica que, não apenas a igreja acatou a ordem do apóstolo Paulo, mas também o imoral, que se arrependeu e recebeu perdão da igreja.
A interpretação de que este homem havia morrido em adultério é um equívoco que pode ser facilmente evitado com a leitura de todo o capítulo, quando Paulo fala claramente no versículo 13 “expulsem esse perverso do meio de vocês”. Só se expulsa alguém que está vivo.
Em segundo plano é possível entender que Paulo confiava no plano de Deus para a Salvação, visto que na carta à igreja de Corinto ele pede aos irmãos que tomem uma atitude para que a pessoa em prática de pecado sem arrependimento experimente as consequências de seu erro e, dessa forma, entenda a necessidade de mudar de comportamento e passe a viver de acordo com a Palavra de Deus, como indicam os comentários da Bíblia de Estudo John MacArthur (“a pessoa não arrependida pode sofrer grandemente sob a disciplina de Deus, porém deixará de ser uma má influência na igreja; e é mais provável é que ela seja salva debaixo desse castigo do que se tolerada e aceita na igreja”) e da Bíblia de Estudo de Genebra (“o propósito desse julgamento era a salvação do homem, mas isso só poderia ser conseguido se suas tendências pecaminosas fossem vencidas”).