Muitos pensam equivocadamente que há contradição na Bíblia porque ao mesmo tempo que se fala de um favor imerecido demonstrado por Deus ao Seu povo, e de uma aliança eterna que Ele faz com eles, há também mensagens ameaçadoras contra este povo de Deus, as quais podem dar a entender que eles não desfrutam efetivamente do Seu favor, como se vê por exemplo no capitulo 65 de Isaías.
A razão deste modo errôneo de julgar consiste no fato de se confundir a justificação com a santificação; a filiação com o viver em vitória; enfim, do ter sido crucificado com Cristo com o ato de carregar diariamente a cruz.
São coisas distintas as promessas absolutas e eternas para aqueles que são filhos de Deus, e o modo que Deus trata com estes filhos em razão da obediência ou desobediência deles.
Assim, Ele disciplina o Seu povo para não condená-lo juntamente com o mundo de impiedade.
E este contraste entre o tratamento que o Senhor dá àqueles que Lhe pertencem e àqueles que são do mundo, por amarem a iniquidade do mundo, é apresentado de modo muito claro no 65º capítulo de Isaías, ao mesmo tempo que é apresentado o desagrado do Senhor para com aqueles que no Seu povo vivem em pecado.
Isto mostra claramente que não é pelo fato de o cristão ter sido justificado pela fé que Ele poderá contar com o favor e o poder de Deus em Seu viver diário, caso viva em pecado.
Os cristãos devem portanto sempre se guardarem de um viver na prática deliberada do pecado porque há a promessa absoluta da criação de novos céus e de uma nova terra nos quais habita somente a justiça.
A vocação portanto para este estado de glória é a prática da justiça e não da iniquidade.
Daí ser ordenado a todos os cristãos que busquem a paz e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor. Importa que haja novos céus e nova terra porque os seus habitantes foram feitos novas criaturas em Cristo, com uma mente renovada e um novo espírito. Então para um homem novo, será preparado tudo novo. Assim muitos israelitas não seriam salvos para acessarem a esta glória prometida futura por serem meramente descendentes de Abraão, segundo a carne.
Um verdadeiro israelita deve ser regenerado pelo Espírito para ser nova criatura em Cristo Jesus.
Somente os que nascerem da água e do Espírito terão acesso ao reino do céu. Então Deus não estava amarrado ao compromisso, à aliança que fizera com os israelitas através dos patriarcas, Ele se voltaria aos gentios para salvar aqueles que se arrependessem dos seus pecados, quando lhes fosse pregado o evangelho.
O evangelho é portanto preanunciado no início deste 65º capítulo de Isaías, demonstrando que Deus salvará a todo aquele que se desviar do pecado, mas manterá nas trevas a todos os que amam a injustiça e praticam a iniquidade.
Deus se voltaria para os gentios que não O conheciam, porque não havia se revelado a eles na antiga aliança, senão somente aos israelitas.
Ele anunciaria o evangelho a eles e lhes ofereceria a Sua salvação, e muitos deles se converteriam a Ele.
Quantos ainda hoje dentre os gentios, nada conhecem do verdadeiro Deus e do evangelho de Cristo, mas que se convertem assim que Cristo é apresentado a eles pela Palavra no poder do Espírito? Isto é maravilhoso porque é o cumprimento da promessa que Ele fez através do profeta Isaías.
É importante frisar que a verdade relativa à salvação dos gentios ocorre conforme revelado por Deus ao profeta no primeiro versículo deste 65º capítulo.
Eles são salvos não porque conheciam ao Senhor ou porque estavam buscando pela Sua face. Isto não seria possível porque Eles nada sabiam dos Seus caminhos.
Então o evangelho é enviado a eles através da pregação e muitos deles se convertem ao Senhor quando ouvem estas boas novas de salvação, e é somente a partir de então que passam a conhecê-lo.
Por isso se diz que a salvação do evangelho é inteiramente pela graça, porque até mesmo se exclui o mérito de que o salvo estivesse buscando antes a Deus e se esforçando para viver de acordo com a Sua vontade, simplesmente porque não conhecia nem ao Senhor, nem à Sua vontade.
Por isso somente um remanescente seria deixado a Israel que se converteria de fato ao Senhor.
Porque a salvação não é segundo as nossas obras, mas segundo a graça.
Israel confiava em suas obras de justiça própria e por isso tropeçaram na pedra que é a graça de Cristo.
Eles estavam endurecidos para a verdade de que eram pecadores necessitados de salvação e pensavam que eram mais santos do que o próprio Deus, apesar de todas as abominações e idolatrias que praticavam.
Os gentios estavam entregues também a práticas abomináveis e idolatrias, mas muitos destes foram salvos, porque fizeram suas más obras na ignorância, e porque se arrependeram destas suas obras assim que tomaram conhecimento da santidade do Senhor.
Mas a maioria de Israel, apesar de ser o povo da aliança que tinha os mandamentos de Deus, os profetas, e tudo o mais que Ele levantou para conduzi-los à Sua presença, se desviaram dEle e de todas as Suas coisas santas para praticarem deliberadamente aquelas coisas que eles sabiam perfeitamente que foram condenadas pelo Senhor e que despertavam o Seu desagrado.
Assim que esperança poderia haver para eles, tendo sido endurecidos com a própria Palavra de Deus?
Tal perigo deve ser evitado por muitos cristãos na Igreja de Cristo que se permitem ficar endurecidos com a própria pregação da verdade.
Eles não admitem serem exortados quanto ao pecado. Eles querem a aprovação de Deus e da Igreja para o viver pecaminoso deles na carne.
Enquanto alguém vive desta forma não há esperança de cura para ele, porque está endurecido exatamente contra o único remédio que poderia curá-lo que é a Palavra do Senhor.
Assim esta profecia de Isaías como toda a Bíblia é maravilhosamente verdadeira porque não aponta por posição conceitual quem é o grupo favorecido por Deus por condição de privilégios, e qual é o grupo que está debaixo do seu desagrado. Não. Ele não faz a distinção desta maneira. Deus distingue não por condição de nascimento, de cultura, de posição na sociedade ou por qualquer outro critério humano. Ele contempla o coração e salva mediante a receptividade e disposição em obedecer a Sua Palavra.
E estes que são verdadeiramente salvos passam automaticamente a servi-lO, ou então manifestam este desejo sincero de não viverem mais para si mesmos, mas para Aquele que por eles morreu e ressuscitou.
E o Senhor mostrará no futuro a distinção que Ele faz entre os que O servem e aqueles que não O servem.
Se servem é porque reconheceram que Ele é Senhor. É o dono de Suas vidas e vontade.
Os que não O servem é porque seguem após os seus próprios pensamentos buscando sempre fazer o que é exclusivamente da própria vontade deles, e que jamais se submeterão à vontade de Deus.
Estes não podem ser alvos de promessas de justiça e paz perfeitas, a começar no milênio, como se vê no final deste 65º capítulo, porque isto não lhes interessa, pois têm prazer na iniquidade.
A verdade revelada aos profetas do Antigo Testamento é confirmada por Jesus e pelos apóstolos nas páginas do Novo Testamento, e por isso é realmente algo para pasmar o modo como a verdade é ocultada em nossos dias, como também o fora em diversos períodos da história da Igreja.
O caráter santo e justo de Deus e o modo correto de servi-lO são ocultados contra um viver ou legalista ou segundo o modo errado de se julgar a graça de Deus, como se fosse um pretexto para pecarmos.
O legalista se firma na sua justiça própria e na sua religiosidade, ainda que usando os próprios mandamentos da Palavra de Deus, e assim permanecem cegos para o fato de que é o Senhor mesmo que nos capacita a viver segundo a Sua vontade.
O que afirma que é o Senhor que tem todo o mérito e que tudo é pela Sua graça, apesar de fazer esta afirmação verdadeira, mas se vive segundo a carne, também erra o alvo da vontade de Deus, tanto quanto o legalista.
Portanto, todos os cristãos são chamados a praticarem a verdade conforme está revelada neste capítulo de Isaías e nas demais Escrituras, especialmente no ensino de Jesus e dos apóstolos no Novo Testamento.
Ali não vemos nenhuma base para uma afirmação legalista ou antinomista, mas a verdade relativa ao modo correto de se viver e fazer a vontade de Deus. O Senhor será misericordioso para com as faltas daqueles que se humilham perante Ele, daqueles que reconhecem de fato que sem Ele nada podem fazer, mas que procuram se inteirar de qual seja a Sua vontade para as suas vidas.
Estes que choram por causa dos seus pecados serão certamente consolados pelo Espírito, porque serão ajudados a vencerem o pecado e a fazerem o que agradável a Deus.
Mas aos que estão endurecidos pelo pecado, e orgulhosos de suas próprias obras de iniquidade receberão a justa retribuição por suas más obras, da parte de Deus (Is 65.6,7).
Baseado em Isaías 65