Os filhos são castigados [amaldiçoados] por Deus por causa dos pecados dos pais (maldição hereditária)?
1- Os defensores da doutrina da maldição hereditária tem em Êxodo 20. 5 seu principal argumento. Esse texto diz: “…porque eu sou o SENHOR, teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniqüidade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem” (Ex 20. 5)
O principal pensamento dos que defendem essa doutrina é que os descendentes sofrem diversas maldições, que são oriundas do comportamento mau dos seus antepassados. No entanto, o texto de Êxodo 20. 5 não sustenta esse pensamento. O texto demonstra que haverá a visitação do juízo de Deus aos descendentes dos ímpios, porém, essa visitação é sobre os que aborrecem a Deus, ou seja, sobre aqueles que agem como agiram seus pais, que andam no mesmo caminho maligno. Observe o trecho: “daqueles que me aborrecem”. Não há como sustentar, com base nesse texto, que alguém totalmente obediente a Deus possa sofrer uma maldição hereditária porque seus antepassados fizeram diversas maldades. Essa pessoa não aborreceu a Deus, pelo contrário, anda nos Seus caminhos.
2- A descontinuidade desse juízo de Deus é evidente quando do arrependimento e mudança de postura da pessoa, independentemente se os seus antepassados foram maus ou bons. Ou também, o inicio desse juízo de Deus sobre a pessoa, se ela optou pelo caminho da desobediência, independentemente se os seus antepassados foram maus ou bons. Vejamos dois exemplos:
A) Samuel e seus filhos
Se os antepassados justos isentam os filhos de maldições hereditárias, o que dizer do exemplo do profeta Samuel? Samuel foi um dos maiores profetas e sacerdotes dos tempos bíblicos, andou com Deus e tinha o Espírito de Deus. Nesse caso, os seus filhos deveriam receber a “benção hereditária” (Êxodo 20. 6)? Vejamos: “Porém seus filhos não andaram pelos caminhos dele; antes, se inclinaram à avareza, e aceitaram subornos, e perverteram o direito.” (1Sm 8. 3). Os filhos de Samuel tiveram um bom exemplo, mas escolheram o caminho do mal. Isso demonstra que cada um responde por si perante Deus. Os filhos de Samuel deveriam ser abençoados, mesmo sendo malignos, só porque seu pai foi justo?
B) Abias e seu filho Asa
Se os antepassados maus transmitem a maldição hereditária aos filhos, então o que dizer do caso do rei Abias, de Judá? Diz-se ao seu respeito: “Andou em todos os pecados que seu pai havia cometido antes dele; e seu coração não foi perfeito para com o SENHOR, seu Deus…” (1Rs 15. 3). Nesse caso, o seu filho deveria herdar uma maldição hereditária vinda dele e de seu pai, pois foram homens malignos. Vejamos, porém, o que a Bíblia diz sobre Asa, filho de Abias: “Asa fez o que era reto perante o SENHOR (…) o coração de Asa foi, todos os seus dias, totalmente do SENHOR.” (1Rs 15. 11-14). Asa escolheu andar nos caminhos contrários ao do pai e do avô, que eram malignos. Não há atribuição alguma de maldição sobre ele. Nesse caso, Asa deveria ser amaldiçoado, mesmo sendo obediente a Deus, só porque o pai e o avô foram malignos?
3- E, para esclarecer definitivamente o tema, temos o texto de Ezequiel 18. Nesse texto vemos os israelitas utilizando um ditado popular para explicar a difícil situação que estavam passando: “…Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos é que se embotaram” (Ez 18. 2). Esse ditado significa, em outras palavras: “Nossos pais é que pecaram no passado e nós é que estamos sofrendo o castigo”. O profeta Ezequiel traz uma palavra de Deus para esclarecer a questão e demonstrar o pensamento de Deus sobre essa questão:
“A alma que pecar, essa morrerá; o filho não levará a iniqüidade do pai, nem o pai, a iniqüidade do filho; a justiça do justo ficará sobre ele, e a perversidade do perverso cairá sobre este.” (Ez 18. 20). Fica claro que se a doutrina da maldição hereditária fosse bíblica, não haveria motivo da repreensão e explicação dada por Deus em Ezequiel 18. Nesse texto fica claro que cada um é responsável pelos seus próprios erros e acertos. (leia Ezequiel 18 inteiro)
Fica claro, ainda, que o arrependimento e a obediência a Deus põem fim a iniquidade que havia na vida da pessoa. É um divisor de águas; e isso, não importando quem foi o antepassado, se foi bom ou não: “Mas, se o perverso se converter de todos os pecados que cometeu, e guardar todos os meus estatutos, e fizer o que é reto e justo, certamente, viverá; não será morto. De todas as transgressões que cometeu não haverá lembrança contra ele; pela justiça que praticou, viverá.” (Ez 18. 21-22)
4- E, para finalizar a questão, temos alguns textos no novo testamento que também iluminam o entendimento de que a maldição hereditária não é uma doutrina bíblica.
Os discípulos de Jesus, ainda em treinamento, trazem a Jesus uma questão parecida com o que se prega hoje sobre maldição hereditária, e que possivelmente muita gente cria [erroneamente] naquela época: “E os seus discípulos perguntaram: Mestre, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego?” (Jo 9. 2). Jesus trata de desfazer a interpretação errada deles do que havia na vida daquele homem: “Respondeu Jesus: Nem ele pecou, nem seus pais; mas foi para que se manifestem nele as obras de Deus.” (Jo 9. 3). Nada de maldição hereditária!
Não há, portanto, motivo para ninguém ficar preocupado com o que seus antepassados fizeram, se irão ou não ser castigados pelos atos deles. Cada vida responde por si, pois Deus é um Deus justo! “Assim, pois, cada um de nós dará contas de si mesmo a Deus.” (Rm 14. 12)
Conclusão:
Se você anda com Deus será abençoado por Ele, independentemente de quem foram os seus antepassados. Se desobedece a Deus estará debaixo da maldição que o pecado traz, independentemente de quem foram os seus antepassados. Lembrando também que o arrependimento e a fé em Jesus Cristo limpa-nos [plenamente e eficazmente] de todo o pecado e nos purifica para vivermos em novidade vida: “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça.” (1Jo 1. 9)
“Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres.” (Jo 8. 36)