O capítulo 59 de Isaías deveria ser meditado por todos aqueles que têm uma definição simples conceitual relativa ao pecado, por influência da chamada teologia liberal, que surgiu em fins do século XIX e que se consolidou no século XX, que tem desviado a muitos da verdade das Escrituras.
A teologia liberal prega e ensina a falsa noção de que o pecado é um problema para o mundo sem Cristo mas não para os cristãos.
Com isto, a Igreja perdeu o poder, porque o pecado tem prevalecido na maioria dos cristãos, os quais descansam neste falso ensino de que tudo está bem com eles simplesmente porque confessaram a Jesus como o Salvador deles, um dia.
Entretanto, poucos destes se colocam de fato debaixo do senhorio de Jesus, poucos os conhecem como Senhor de suas vidas, tal como ocorria na Igreja Primitiva, de modo que isto era o segredo do poder de Deus que se manifestava neles e entre eles.
A condição do homem é de escravidão ao pecado e por isso lhe é dada a promessa de um Redentor, mas não um Redentor que deixará de continuar trabalhando para destruir completamente o pecado nas vidas daqueles aos quais tem redimido.
O homem precisa de um Redentor porque não é por sua própria capacidade e meios que pode vencer o pecado.
Por isso, o pecado que é denunciado neste capítulo 59 de Isaías, não é apenas o pecado dos ímpios, mas o pecado de toda a humanidade, inclusive dos cristãos.
O que Deus quer nos mostrar aqui é que toda e qualquer transgressão faz separação entre Ele e nós.
O quanto lhe desagrada um viver pecaminoso!
No capítulo anterior (58) nós vemos que a mera religiosidade (falsa) não pode enganar a Deus e trazer a nós o Seu favor, antes agrava as Suas correções.
Ele exige vidas verdadeiramente santas que mortifiquem toda forma de pecado.
Foi para este propósito que Ele nos proveu de um Redentor.
É um Redentor que nos separa das nossas transgressões .
Em Romanos se afirma que o Redentor nos desviará das nossas transgressões, e no texto do verso 20 deste capítulo de Isaías, no qual o texto de Romanos se baseia, é dito que o Redentor virá àqueles que se desviarem das transgressões.
Na verdade ambas as coisas ocorrem simultaneamente, porque Cristo não pode desviar das transgressões quem não procure se desviar delas.
Deus julga o pecado onde quer que ele seja encontrado.
Falta de paz e alegria espiritual e divina são formas de Deus julgar o pecado.
Ele nos priva de Suas bênçãos espirituais.
Ele nos deixa à mercê das circunstâncias da vida.
As trevas prevalecem e não a luz.
E tantas outras coisas que nos roubam a paz de mente e o deleite pelo viver nos alcançam quando vivemos em pecado.
Isto está declarado de modo bastante enfático nos versos 9 a 11 deste capítulo 59 de Isaías:
“9 Pelo que a justiça está longe de nós, e a retidão não nos alcança; esperamos pela luz, e eis que só há trevas; pelo resplendor, mas andamos em escuridão.
10 Apalpamos as paredes como cegos; sim, como os que não têm olhos andamos apalpando; tropeçamos ao meio-dia como no crepúsculo, e entre os vivos somos como mortos.
11 Todos nós bramamos como ursos, e andamos gemendo como pombas; esperamos a justiça, e ela não aparece; a salvação, e ela está longe de nós.”.
A salvação referida no final deste verso 11 não é propriamente a salvação da alma pela fé em Cristo, mas a falta de livramentos, especialmente das opressões e tentações do Inimigo. Em suma, uma vida sem poder para vencer e prevalecer no meio das circunstâncias difíceis.
“1 Eis que a mão do Senhor não está encolhida, para que não possa salvar; nem surdo o seu ouvido, para que não possa ouvir;
2 mas as vossas iniquidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados esconderam o seu rosto de vós, de modo que não vos ouça.”
Eis aqui declarada a verdade relativa a Deus e a nós. Não que Ele não queira salvar e abençoar, mas os nossos pecados impedem suas bênçãos; que nossas orações sejam ouvidas, e fazem com que Ele desvie o Seu rosto de nós.
É preciso se converter dos pecados para uma vida de verdadeira santidade e de obediência à vontade do Senhor, não apenas no pensamento, mas na vida prática, sobretudo no amor, misericórdia e justiça, que se exige de nós no relacionamento com o nosso próximo.
Não podemos esquecer que este capítulo de Isaías é uma continuação da resposta dada por Deus àqueles que estavam protestando que estavam jejuando e orando, e Ele, no entanto, não estava respondendo aos seus jejuns e orações.
Deus sempre quer salvar e abençoar, e tem provado isto com o fato de nos ter dado um Redentor, mas não pode haver vida vitoriosa, onde não haja empenho para se vencer o pecado.
O ouvido do Senhor não está cansado de ouvir orações e nunca se cansará de ouvi-las (v. 1), mas Ele, que é santo, não pode ouvir as orações dos que vivem na iniquidade.
Não é Deus que se cansa de ouvir orações, nós é que nos cansamos de orar.
Não são os Seus ouvidos que têm desprazer em nos ouvir. Nós é que não temos prazer em ouvi-lO, e especialmente aquilo que Ele nos diz na Sua Palavra.
E é este o motivo de não sermos ouvidos e atendidos por Ele quando pensamos que estamos orando, quando na verdade estamos exigindo que Ele faça aquilo que é da nossa própria vontade.
A teologia que afirma que por causa da misericórdia de Deus todos podem estar confiantes de serem ouvidos e atendidos em suas orações independentemente de viverem no pecado, é uma falsa teologia, porque faz uma afirmação que é contrária à verdade revelada na Palavra.
Por isso, para que não fosse anulada ou vencida por qualquer teologia liberal, a verdade relativa ao pecado do Seu próprio povo é apresentada pelo Senhor ao profeta com uma descrição gráfica bastante impressiva nos versos 3 a 8.
São denunciadas:
– a violência e a iniquidade das mãos; e a mentira e a perversidade pronunciada pela boca (v.3):
– o mal que é abrigado no interior do coração produz atos de iniquidade e injustiça, e indiferença pela justiça; e por outro lado confiança no que é vão (v. 4);
– o trabalho e atividade deles estão voltados para a concepção do mal (ovos de basiliscos e teias de aranhas). O fruto das suas ações é alimento que produz morte e não vida, e quem atacar ainda que inadvertidamente o mal que eles concebem em seus corações, em vez de exterminá-lo, fará com que ele se reproduza (víbora que sai do ovo). (v.5).
– o produto das ações deles não servem para cobrir os seus pecados, porque suas obras são obras de iniquidade e de violência (v. 6).
– são inclinados apressadamente para o mal, e por isso derramam sangue inocente, e pensam somente em iniquidade, de maneira que há desolação e destruição no caminho deles (v. 7);
– por isso não podem conhecer o caminho da paz e da justiça, porque caminham por veredas tortas (v. 8).
Deus afirma também expressamente no final do verso 8 que aqueles que andam por caminhos tortuosos não podem conhecer a paz, isto é, viver e experimentar a paz sobrenatural do Senhor em toda e qualquer circunstância, porque Ele a reterá deles.
Quem vive no pecado não pode portanto esperar experimentar a paz do Senhor, porque esta e dada por Ele somente àqueles que não vivem na prática do pecado.
À luz de toda esta odiosidade do pecado que habita na natureza terrena de todas as pessoas, Deus declara através do profeta que somente Ele é a esperança do Seu povo.
Que a salvação é provida por Ele próprio, uma vez que o pecado contaminou tão profundamente toda a humanidade.
Ele se proverá de santos através do Redentor, pelo Seu próprio poder e méritos.
E este trabalho de purificação deste perverso coração pecaminoso é um trabalho que somente o Espírito Santo pode realizar.
O homem não está habilitado para realizar tal trabalho pela sua própria incapacidade e fraqueza decorrente do pecado que nele opera.
Por isso quando nos sentimos como mortos entre os vivos, por estarem as graças espirituais morrendo na nosso viver, e quando percebemos trevas em nós e ao nosso redor e não a luz de Jesus, quando nos sentimos incapazes e inabilitados para viver de modo justo e santo; quando andamos como cegos das verdades da Palavra de Deus e por isso tropeçamos (v. 9, 10).
Quando andamos gemendo como gemem as pombas, e esperamos pela justiça e ela não aparece, e por livramento, e sentimos que ele está longe de nós (v. 11), a causa disto sempre será a multiplicação das nossas transgressões diante de Deus, ainda que as conheçamos, porque apesar de conhecê-las Deus não nos dará o poder para vencê-las por causa da falta da nossa consagração a Ele para fazer a Sua vontade.
Nós nos sentiremos acusados pelas nossas iniquidades, mas não poderemos vencê-las enquanto não nos dispusermos a um verdadeiro arrependimento (v.12).
Quando a verdade deixa de ser praticada a iniquidade se multiplica.
Quando o Senhor e a Sua Palavra são negados por deixarmos de segui-lO, o nosso falar será opressivo e rebelde, e o nosso coração conceberá palavras de falsidade (v. 13).
Quando isto acontece o direito e a justiça que são segundo a verdade desaparecem, e a retidão não pode entrar em nossas vidas, em nossas famílias, em nossas igrejas, na nossa sociedade (v. 14).
Veja que não se diz no final do verso 14 que a equidade, isto é, a igualdade de todos perante Deus, será difícil de entrar em nosso meio, mas que ela não poderá entrar.
Isto porque a orgulho, a violência, a prepotência prevalecerão mesmo naqueles que sejam muitos religiosos.
Eles usarão a própria religião e espiritualidade para se sentirem superiores aos seus irmãos.
E Deus não pode de modo algum se agradar disto, porque quando a verdade desfalece, aqueles que procurarem viver de modo justo e santo, se desviando do mal, serão atacados pelos que estão sendo vencidos pelo mal (v. 15).
Quando todo o povo de Deus se encontra em tal condição quem poderá entre eles ser um intercessor efetivo para que este estado de coisas seja modificado?
E se houvesse alguém, por quanto tempo esta pessoa poderia prevalecer diante de Deus com a sua intercessão em favor de tão agravado estado de pecado?
Ninguém poderia fazê-lo pelo seu próprio poder e força. Esta é a grande verdade, e por isso o Senhor age por Sua exclusiva misericórdia para trazer a salvação ao Seu povo, deste estado miserável de derrota ao pecado (v. 16).
E não somente o Senhor se veste com a couraça da justiça e do capacete da salvação para lutar contra o mal para salvar os que se arrependerem de seus pecados, como também das vestes de guerra da vingança, com o manto do Seu zelo, para dar a cada um conforme as suas obras, para tomar vingança contra os Seus inimigos que não se arrependem dos seus pecados (v. 17,18).
Quando o Senhor julga os pecadores impenitentes os lançando com o Seu grande poder no tormento eterno, isto traz grande temor e glória ao Seu nome (v. 19), mas aos que se desviam das suas transgressões, pelo arrependimento, em vez de vingança contra o pecado, Ele envia na Sua bondade e misericórdia um Redentor e faz um pacto com estes e com os seus descendentes, de não retirar deles o Seu Espírito, e nem estas palavras verdadeiras, que colocou na boca do profeta, porque tem feito a promessa de mantê-las nas bocas destes que se arrependem e também na boca dos seus descendentes, isto é, daqueles que se converterão através do testemunho deles (v. 20,21).
Observe que o Espírito e a Palavra vão juntos, e é por eles que a Igreja é mantida. Porque a palavra nas bocas dos pastores não nos alcançará a menos que venha com a unção e o trabalho do Espírito.
O Espírito faz o Seu trabalho em justa cooperação com a Palavra de Deus, e é neste fundamento que a Igreja é edificada.
A couraça da justiça da armadura que usamos não é nossa mas do Senhor Jesus.
O capacete da salvação que usamos na pregação não é nosso, mas do Senhor.
E assim todos os itens da armadura que Paulo afirma em Efésios pertencem a Deus.