Minhas avós, tanto materna, quanto paterna, respectivamente Isolina e Antônia, quando observavam uma pessoa que se ofendia por qualquer coisa, que elas consideravam banais diziam: Ele/ela é muito melindroso (a).
Cresci considerando que não deveria ser melindroso e mais tarde procurei saber o que significava, de forma mais abrangente, a palavra melindroso, aí ficou por conta da consulta aos dicionários: Que possui melindre. De um lado – delicado, inocente, puro, cândido. De outro lado – perigoso, arriscado, débil, fraco, que tem facilidade em se ofender. Partindo disso, pude ao longo do convívio social perceber esses tipos de personalidades. Algumas pessoas que conheci muito melindrosas, mas com o amadurecimento se tornaram melhores, ou seja – com menos melindre, o que é possível.
Como sempre me interessei pelas ciências humanas, mais precisamente pela alma humana, me embrenhei pelo complexo, mais atraente caminho da teologia e psicanálise, ciências que me davam melhores condições para perceber as relações do homem com o mundo abstrato, social e psíquico. Mas, na medida em que fui me aprofundando nessa busca, que tem começo, mas não tem fim, percebi que, quando tratamos de personalidade, não podemos parar só na individualidade humana, mas naquilo que a representa, através da coletividade. Assim ficou mais fácil, tanto entender o conceito de inconsciente coletivo, quanto da vertente junguiana e freudiana, para explicar o processo que permeia e se prolifera no mecanismo da estrutura do psiquismo humano, como também, admitir que a soma do coletivo forma uma energia que influencia todas as instituições, por mais puritanas que sejam. Por exemplo, se temos um sistema político-econômico, dotado de uma personalidade, que possui um E.P. (estrutura de pensamento) corrupto, que se estriba no princípio da escassez, a tendência é enganar para garantir o máximo, afim de manter segura a individualidade. Acontece que todos começam a pensar, ou comportar-se assim, logo se produz uma “cultura dos espertalhões”em que todos condenam a corrupção, mas ninguém abandona o vício. Sendo assim, todas as instituições se contaminam, desde o legislativo, executivo, judiciário e as demais instituições – política, esportiva, religiosa, etc.
O resultado disso é termos uma sociedade estranha em todos os aspectos, que cria também estranhos mecanismos de sobrevivência, a exemplo do “jeitinho brasileiro”que representa a ponta do iceberg da anomalia da personalidade brasileira. Isso está presente em tudo. Você vai ver que o tal “jeitinho” está presente em tudo, até no meio de arrecadação de ofertas nas denominações cristãs, o que dificulta a aplicação do raciocínio lógico, do que é justo e condizente à ação preventiva, a visão de futuro, em todos os segmentos. Cito três exemplos: Saúde, educação e segurança, tão propalada nas campanhas eleitorais. Em todos os três estamos regredindo: A saúde privada hoje é pior do que a pública há 20 anos atrás; assim acontece com as demais instituições. Para ilustrar melhor, só se constrói novos prédios escolares quando as salas estão superlotadas, assim acontecem com os presídios e com tudo o que precisa de investimentos na área pública. Mas o pior, é que tudo isso vem se agravando de forma exponencial.
A soma de todas estas mazelas produziu um Brasil esquizofrênico, que sofre ciclicamente episódio psicótico grave, como o atual, frente à crise econômica internacional, onde ele se apresenta de forma melindrosa. Vamos citar a relação perturbada entre o Brasil – dólar, corrupção, infraestrutura:
Brasil e o dólar: Se o dólar está baixo, o Brasil reclama porque não consegue vender suas mercadorias. É o que vem acontecendo nos últimos anos, graças ao poder de compra interno, a crise está sendo contornada. Os empresários pedem interferência em favor da alta do dólar para poderem ser mais competitivos no mercado externo e parece que o governo também estava de acordo. Se olharmos na relação direta do poder de compra do dólar no Brasil, comparando com o período em que o valor de um dólar era igual a um real, diríamos que o dólar teria de ser hoje, no mínimo 5,00 por 1.00. Mas, nos últimos dias, o seu aumento repentino causou preocupação e deixou todo o mercado nervoso e pronto para atacar o consumidor, aumentando quase todos os produtos, até o que é produzido aqui, e onde se procura uma relação com o dólar para justificar reajustes.
Veja, como nos “ofendemos” facilmente? Se o dólar sofre baixa deixamos de exportar. Se aumenta, repassamos o aumento às nossas mercadorias e abrimos para alta da inflação. Por que então os preços aumentaram tanto, mesmo em tempos de dólar baixo? Será que daqui a alguns meses ou poucos anos teremos que passar por um novo processo de reforma econômica com alteração da moeda? No meu parco conhecimento sobre economia, posso prever exatamente isso. Vejam só! Se a população consome além do que o mercado delineou, também resulta em inflação; para que isso não aconteça o governo intervém com altas de juros. A previsão de crescimento do PIB para este ano é de 4.7%. Na verdade queremos e precisamos crescer um percentual maior, mas sabemos que não é possível. Se sabemos que não é possível mas queremos, isso não mostra algo contraditório? Sim! Se queremos a valorização do dólar, e quando aumenta ficamos desnorteados, isso não é estranho? Mas por que queremos? Há uma disfunção, uma alteração da personalidade. Quando acontece qualquer alteração na economia e nos permite uma base de justificação da nossa inércia, choramos, mas de outro lado nos sentimos bem, porque surge um bode expiatório. Somos ou não somos melindrosos!
Nos Estados Unidos, diante da crise que começou em 2008, os juros baixaram e o povo está sendo estimulado a consumir e o governo trabalha abrindo o mercado para melhorar a infraestrutura. Por que o Brasil há dezenas de anos não sai desse marasmo maldito? A economia global permitiu que surgisse os emergentes, e porque o Brasil, que tem, do ponto de vista da economia natural, melhores condições de decolagem, está perdendo a oportunidade? Por que? Porque cresce menos do que os demais emergentes? Em parte, porque temos um sistema e exercício político mesquinho. Uma política eleitoreira das mais perversas, incapaz de trabalhar em favor das grandes causas, incapaz de criar condições para atuar de forma precisa nas reformas sociais e investir, de fato, na infraestrutura. Consequentemente, a classe empresarial que tem uma visão mais razoável, nem sempre justa, sabe que, quando a população tende a consumir mais, não podendo atender a demanda, não por falta de recursos, mais por falta de infraestrutura, que não permite escoar a sua produção, porque faltam, rodovias, ferrovias, portos, etc. Assim fica mais fácil dizer não, à população, aumentando os seu produtos, e para estancar esse fluxo o governo aumenta os juros. O governo sempre se sente perseguido pela inflação, portanto precisa estar de “olho nos empresários e no consumidor”, sem perder de vista o pensamento do banco central, que tem uma certa “liberdade vigiada”. Assim, nessa espécie de acompanhamento espera ter algum dividendo, mas, sabe-se que, tudo isso é um pouco irracional, ou no mínimo perigoso e hostil, onde a energia governamental está mais para a manutenção do que é, do que, sobre aquilo que deverá ser.
O Brasil só será uma grande economia quando ouvirmos as seguintes notícias:
Banco Central taxou os juros em 5% ao ano. Cartão de crédito tem juro anual de 20 %. O Banco Central cancelou operações de cheque especial, e apesar disso a previsão do PIB é de 7% e inflação 3% ano. Quando você ouvir esta notícia, eu não estarei mais por aqui, mas tenha certeza, foi resultado de uma grande reforma, uma espécie de revolução no sistema político, que apresentou resultados concretos, em todo o sistema político-econômico-social, do Brasil, elevando-o para um patamar condizente à sua grandeza natural e populacional. Mas isso só acontecerá aliado a uma conscientização política mais abrangente, utilizando-se de todos os espaços do direito democrático, com políticos que realmente tenham visão social e econômica e que possam produzir transformações convincentes nos seu próprios partidos, não criando outros, que acabam elevando a “torre de babel político-brasileira”.
Há um longo caminho a percorrer, mas para encurtá-lo devemos começar eliminando as raposas da velha política brasileira, os joios nefastos da sociedade, através da nossa participação consciente no acompanhamento do processo eleitoral, que apesar da falta de transparência, ainda é possível ver a sombra daqueles que se movimentam em direção à justiça social, ao crescimento sustentável, à política de progresso, ao interesse real da nação, buscando espaço para melhorar a educação do nosso pais, para que outras áreas possam também ser beneficiadas.
Francisco Meirinho
Teólogo e Psicanalista