Há um excelente sermão de Charles Haddon Spurgeon, intitulado Entre Leões, no qual ele destaca especialmente a insensatez em se tentar urrar com aqueles que urram conosco, pela sua condição de serem contrários a Cristo e ao seu evangelho.
Spurgeon diz que ovelha não urra, e que deve portanto simplesmente se entregar ao cuidado do seu Pastor Supremo – Cristo – para viver neste mundo de muitos leões que procuram devorar o viver santo e justo da pessoa piedosa.
Aplicado e estendido à vida prática de nossos dias, isto deveria ser considerado mormente em se refletir do quanto possui de evangélico e divino levantar bandeiras para a transformação da sociedade como um todo, tentando, ainda que indiretamente impor valores cristãos e evangélicos, sobretudo pela via do exercício da política, seja ela governamental, em ONG’s, ou o que for.
Não encontramos respaldo bíblico para se fazer tal coisa em nome de Cristo. Se alguém deseja fazê-lo que o faça em seu próprio nome, ou de sua agremiação secular, mas jamais em nome da religião, porque não é este o propósito do evangelho.
Quando Jesus estabeleceu a ordem de se pregar o evangelho a todos e em todas as partes do mundo, o alvo não é o de converter todas as pessoas do mundo à fé evangélica, mas alcançar os eleitos através da pregação – Deus conhece os que hão se ser salvos, e os salvará por seu próprio poder e meios, sem que nenhum venha a faltar.
Então, quando se age como a palmatória do mundo, quando se pensa em converter toda a sociedade à fé cristã ou aos valores cristãos, não é de se estranhar que se esteja urrando, apesar de ser ovelha, a leões, e a consequência imediata é que estes leões urrarão e prevalecerão, porque farão o que lhes é próprio, segundo a sua natureza.
Por isso nosso Senhor, em outra comparação ilustrativa, nos adverte com as seguintes palavras:
“Não deis aos cães o que é santo, nem lanceis ante os porcos as vossas pérolas, para que não as pisem com os pés e, voltando-se, vos dilacerem.” (Mateus 7.6)
Ele pinta os que Lhe odeiam e ao evangelho, e perseguem os cristãos com estas cores fortes para destacar o desprezo deles pelo que é santo e justo, e a sua disposição em dilacerar os que lhes incomodam tentando lhes convencer da santidade que há na Palavra de Deus – ressalte-se a imprudência e falta de sabedoria deste comportamento de tentar impor a verdade do evangelho porque, pelo mesmo evangelho nos é ordenado evitar a pessoa facciosa, desviando-se dela.
E para o mesmo propósito, Jesus nos recomenda mansidão e cautela ao pregar a verdade num mundo em que há pessoas dispostas a usarem até mesmo de violência extrema para deter a citada pregação:
“Eis que eu vos envio como ovelhas para o meio de lobos; sede, portanto, prudentes como as serpentes e símplices como as pombas.” (Mateus 10.16)
O modo de ser sal e luz do mundo, portanto, não é impondo padrões à sociedade como um todo, mas vivendo santa, justa e piedosamente, no amor de Cristo, fazendo o bem a todos, inclusive aos nossos inimigos e aos que nos perseguem e amaldiçoam, todavia, nunca se esquecendo que a palavra do evangelho e o poder da graça de Jesus Cristo, há de se mostrar eficaz tão somente àqueles que se arrependem e que de bom grado e voluntariamente acolhem a Palavra da verdade com mansidão em seus corações.
Pr Silvio Dutra