Deus não quer ver seu povo doente e nem sofrendo, mas há uma espécie de ferida que produz cura, e esta deve ser praticada entre os crentes em geral.
“Fira-me o justo, será isto uma benignidade; e repreenda-me, isso será como óleo sobre a minha cabeça; não recuse a minha cabeça…” (Salmo 141.15)
Ao dizer; “fira-me o justo”, Davi não falava sobre uma ferida física, e sim emocional. Referia-se ao desconforto (e até mesmo dor) produzido pela repreensão. E, apesar de se referir a algo aparentemente ruim, ele menciona as bênçãos provenientes deste ato: “e me será por benignidade, será como óleo sobre a minha cabeça”.
Todos precisamos ser ministrados através de outras pessoas, e isto envolve não apenas ouvir palavras amáveis de encorajamento, mas também palavras firmes de repreensão e correção! Moisés foi um homem que ouvia a Deus tão claramente, que tinha revelações poderosas sobre grandes e pequenos detalhes concernentes à condução do povo de Israel… no entanto, precisou ser corrigido por seu sogro, e aprendeu dele a importância de se trabalhar com grupos de liderança (Ex.18).
Isto me fez questionar varias vezes: se Deus falava sobre tanta coisa diretamente com Moisés, porque não falou acerca disto? Na verdade falou, mas não diretamente. Deus usou Jetro para que Moisés soubesse que por maior que fosse sua intimidade com Ele, por maior que fosse sua sensibilidade de ouvir a voz divina, ainda assim ele necessitava de pessoas que pudessem corrigi-lo e instruí-lo, pois ninguém é perfeito ou completo. Todos precisamos de pessoas que possam nos ministrar.
A Bíblia diz que aquele que se isola insurge-se contra a verdadeira sabedoria (Pv. 18:1). Ninguém pode viver sozinho recusando-se a ouvir outros. Lembro-me de quando Deus deu-me uma experiência inusitada e que me serviu para esclarecer bastante este princípio. No fim de um culto abençoado, o Senhor começou a se mover entre nós e eu estava muito à vontade para fluir no Espírito; recebi do Senhor algumas palavras proféticas e as comuniquei às pessoas a quem eram dirigidas. Não o fiz de púlpito, desci até cada uma delas e lhes falei algo da parte do Senhor. Quando voltei à plataforma, Deus me deu uma visão interessante com uma irmã que tinha ido à frente no apelo; eu a vi com uma trombeta de ouro em sua mão direita para tocar, mas naquele momento em que o fazia, refletindo insegurança, ela punha sua mão esquerda na frente do instrumento, reprimindo assim seu som. Enquanto eu refletia tentando entender o significado do que Deus me mostrava, pois entendo que muitas visões são simbólicas, o Espírito falou clara e doce mente no meu íntimo: “ela tem uma mensagem da minha parte, mas está insegura e com receio de falar. Vá a ela e diga que fale a minha palavra!”
Prontamente fui até a ela e lhe disse o que o Senhor havia me dito. Encorajei-a a falar o que havia recebido. Ela, muito impressionada, olhou diretamente nos meus olhos e falou; “É verdade, pastor, e esta irmã ao lado é minha testemunha de que Deus me deu um a palavra e eu estava receosa, de comunicar, mas agora sei que devo faze-lo. E a palavra é para você!”
Eu quase caí de costa! Ela com muito amor e carinho disse-me que seu receio se dava ao fato de ela não se ver no direito ou posição de tentar me instruir, pois eu tinha autoridade sobre a vida dela e não o contrário… mas ela me via errando em relação a uma Palavra de Deus que eu havia recebido por ocasião do meu estabelecimento no ministério, e, de fato, Deus a usou para que eu consertasse algo em minha vida!
Depois disto comecei a pensar comigo mesmo e achar até divertido o ocorrido. Deus me pegou de jeito. Eu não tinha como não ouvir aquela irmã depôs da palavra que lhe dei! Então fiquei pensando na burocracia toda da coisa. Dizia para Deus: “O Senhor não podia ter falado direto comigo sobre o assunto? Porque falar comigo que outra pessoa tinha uma mensagem, para no fim a mensagem voltar para mim mesmo?” E em meio a este questionamento, o Senhor me disse que queria me ensinar a ouvir outros, a se deixar ser corrigido quando necessário … e jamais esqueci disto!
FERIDAS DE AMOR
A Bíblia fala mais sobre este tipo de “ferida” que o justo deve praticar em relação àqueles que ama:
“Melhor é a repreensão aberta do que o amor encoberto.” Fiéis são as feridas dum amigo, mas os beijos dum inimigo são enganosos.” (Provérbios 27.5,6)
Muitas pessoas agem com falsidade, preferido a dissimulação e o fingimento do que a franqueza e sinceridade da repreensão. Mas as Escritura Sagradas declaram que a repreensão aberta (fruto de amor sincero de uma pessoa franca) é melhor do que o amor encoberto (que não se manifesta por nunca ter coragem de falar a verdade). Precisamos aprender a falar a verdade em amor. Adular não leva a lugar algum e impede o crescimento espiritual de todos.
“O que repreende a um homem achará depois mais favor do que aquele que lisonjeia com língua”. (Provérbios 28.23)
A verdade deve ser dita. Pessoas que amam devem corrigir e repreender seus amados. As feridas de amor (provocadas pela repreensão) são mais valiosas que os beijos da falsidade (do fingimento de quem não quer contrariar ninguém). Os apóstolos Paulo e Pedro viveram juntos um a experiência forte neste sentido (Gl. 2.11-16). Paulo repreendeu Pedro diante de todos por estar agindo de modo errado quanto ao jeito de se relacionar com os crentes gentios.
DEVER DO CRISTÃO
Repreender não é apenas dever do pastor (no púlpito ou em aconselhamentos e disciplinas). Cada cristão tem a incumbência de faze-lo. Jesus declarou:
“…se teu irmão pecar contra ti, repreende-o …” (Lucas 17.3)
Há momentos em que os líderes terão que se posicionar com autoridade para repreender, pois Paulo instrui a Tito: “Exorta e repreende com autoridade” (Tt. 2.15). Porém, não que dizer que esta ação deva se limitar somente aos líderes. Todo crente deve aprender a corrigir seu irmão(ã) quando este falhar.
“Tende cuidado, irmãos, jamais aconteça haver em qualquer de vós perverso coração de incredulidade que vos afaste do Deus vivo; pelo contrário, exortai-vos mutuamente a cada dia, durante o tempo que se chama hoje, a fim de que ninguém se endureça pelo engano do pecado.” (Hebreus 3.12,13)
QUEM PODE REPREENDER
Quando encorajamos os irmãos a praticarem o princípio de repreensão e correção, corremos o risco de sair de um extremo e ir a outro. Embora não é qualquer um que, dentro da igreja, pode chegar e repreender alguém; é necessário ter certa maturidade para isso. Há alguns critérios bíblicos para tal, e entre eles Paulo destaca dois importantes: bondade e conhecimento.
“Eu, de minha parte, irmãos meus, estou persuadido a vosso respeito, que vós já estais cheios de bondade, cheios de todo o conhecimento e capazes, vós mesmos, de admoestar-vos uns aos outros.” (Romanos 15.14)
Uma pessoa cheia de bondade é bem diferente de uma cheia da amargura. A amarga, não corrige, briga com todo mundo! Mas repreender é algo que se faz com um coração cheio de bondade; portanto, somente um crente em tal condição é capaz de ferir o justo em seu benefício. Caso contrario, será prejuízo.
Também é necessário conhecimento bíblico, experiência de vida cristã. Uma repreensão é sempre seguida de conselho, mostra não apenas o erro em si, mas aponta a forma correta de comportamento. Não deve ser fundada meramente na opinião de alguém, mas na Palavra do Senhor. O apóstolo Paulo deixa claro que não é qualquer um que tem a capacidade de se exercitar nesta prática, mas que os que estão cheios de bondade e conhecimento já se encontram prontos para isto.
A FORMA DE FAZÊ-LO
Vimos quem pode repreender a seu irmão quando este se encontra em erro, e agora quero lançar algumas bases bíblicas sobre a maneira correta de faze-lo:
1) Como a filhos amados: “Não escrevo estas coisas para vos envergonhar, mas para vos admoestar, como a filhos meus amados.” (1 Co 4.14).
2) Em espírito de mansidão: “Irmãos, se um homem chegar a ser surpreendido em algum delito, vós que sois espirituais corrigi o tal com espírito de mansidão; e olha por ti mesmo, para que também tu não sejas tentado.” (Gl 6.1).
3) Com sensibilidade para tratar com cada caso: “Exortamo-vos também , irmãos,, a que admoesteis os insubordinados, consoleis os desanimados, amparai os fracos e sejais longânimos para com todos.” (1 Ts 5.14).
4) Não como inimigo, mas como irmão: “Todavia, não o considerais com inimigo, mas admoestai-o como irmão.” (2 Ts 3.15) .
NOSSA ATITUDE
A Bíblia compara o ato de repreender ao de ferir, porque é exatamente isto que ele causa em nossa alma: dor. Nossa natureza humana é egocêntrica, auto-suficiente, orgulhosa. Se não nos deixamos ser tratados por Deus, não teremos um coração ensinável. Meu propósito não é tanto o de ensinar os crentes a corrigirem uns aos outros como o é de ensina-los a aceitar a correção!
Como pastor estou constantemente tendo que exercitar a pratica da admoestação, e vejo como é difícil (mesmo quando alguém reconhece seu erro) uma pessoa “engolir” aquele momento.
Olho para minha própria vida e para os momentos em que eu mesmo tenho sido repreendido, e reconheço: não é fácil. Nosso íntimo reage. Mas precisamos apreender a ter um espírito ensinável, um coração que se sujeita à ministração de Deus através dos irmãos:
“Sujeitando-vos uns ao outros no temos do Senhor.” (Efésios 5.21)
É de suma importância que nos conscientizemos do papel da correção e repreensão dentro da casa do Senhor. O livro de Provérbios nos dá vários conselhos acerca da forma errada e correta de vermos a repreensão:
1) O que abandona a correção erra (Pv 10.17).
2) O que odeia a repreensão é estúpido (Pv 12.1).
3) O prudente é ensinável , pois se abre para a correção (Pv 17.10).
4) O que atenta para a repreensão, lucra com isso! (Pv 25.12).
CONCLUINDO
Precisamos apreender a ouvir a repreensão. Por mais desconfortável que seja no momento em que recebemos, devemos lembrar que depois ela produzirá cura e restauração:
“Na verdade, nenhuma correção parece no momento ser motivo de gozo, porem de tristeza; mas depois produz fruto pacífico de justiça nos que por ela têm sido exercitados.” (Hebreus 12.11)
Precisamos aprender a repreender nossos irmãos quando estão em erro. Tenho conhecido tantas pessoas que assistiram verdadeiros desastres na vida de outros que lhes eram queridos, mas não quiseram falar nada para não de indisporem, para não comprometerem o relacionamento!
O problema não é falar a verdade, e sim a forma como o fazemos. Se falamos a verdade em amor, seremos melhor recebidos. Se o fizermos num espírito altivo, haverá problemas.
Mas ainda assim, a repreensão será uma ferida. Trará tristeza momentânea. Porém, a cura que dela brotará estará continuamente dizendo: valeu a pena! Precisamos aprender a ser corrigidos. Creio que devemos orar ao Senhor e pedir-lhe um coração ensinável. E por outro lado, além de aprendermos a ser corrigidos, devemos aprender a corrigir. Não podemos assistir o erro e permanecer quietos.
Devemos, por amor ao Corpo de Cristo e obediência à Palavra, corrigir. Confrontos são inevitáveis em qualquer tipo de relacionamento, e na igreja não será diferente. Paulo confrontou Pedro, Barnabé e outros em público, e haverá momentos em que nós teremos que fazer algo semelhante. Portanto, penso que devemos nos preparar em oração para isto também.
E depois de aprendemos a ser corrigidos, penso que devemos ensinar nossos filhos, discípulos e liderados a fazerem o mesmo… Que o Senhor nos ajude!