“Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? É Cristo Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós.” (Rom 8.33,34)
Veremos Cristo como o objeto da fé. E a sua morte e ressurreição sendo o suporte, o fundamento da fé e a causa da nossa justificação.
E, portanto, assim como vimos a fé de Cristo para nós, no nosso discurso anterior intitulado “Cristo Estabelecido”, então agora vamos ver o que a nossa fé deve ser para ele, e focaremos somente a fé justificadora, porque a justificação foi propriamente o assunto tratado quanto à fé de Cristo por nós, e é também adequadamente apresentada por Paulo, como aquela fé que os crentes devem ter nele. Agora, a fé é chamada justificadora, porque tem apenas a justificação como seu objeto; assim como ela vai nos conduzir a Cristo para justificação; assim, tudo o que falarmos deve se limitar somente a isto, conforme o propósito do texto. E sobre isso, o texto destaca duas coisas:
1. Ele amarra em Cristo o objeto disto: Quem os condenará? Cristo morreu, etc . E ele sendo o único sujeito daquelas quatro particularidades que destacaremos a seguir, como incentivos à fé, deve necessariamente ser, portanto, o objeto aqui estabelecido para nossa fé.
2. Em Cristo, temos aqui todas as quatro coisas em que consiste o triunfo para os crentes, para lhes assegurar que não serão condenados, mas justificados por causa disto:
Cristo (1) morreu (2), ressuscitou (3), está à direita de Deus (4). E intercede por nós.
Então para atender ao propósito do texto, devo destacar estas duas coisas que devem ser feitas:
1. Direcionar sua fé a Cristo, como o seu objeto certo.
2. Encorajar a sua fé com base nestas várias ações de Cristo por nós
Vejamos então, primeiro, o direcionamento a Cristo como o objeto da fé.
1. Cristo é o objeto de nossa fé, na comissão conjunta com Deus Pai.
2. Cristo é o objeto da fé, em oposição à nossa própria humilhação, ou graças, ou deveres.
3. Cristo é o objeto da fé quanto às promessas.
1. Primeiro, Cristo é o objeto da fé, na comissão conjunta com Deus Pai. Então, aqui, é Deus que justifica, e Cristo que morreu. Ambos são estabelecidos como fundamento da confiança de um crente. Assim em outro lugar, a fé é chamada de fé (ou seja, em Deus), que justifica o ímpio, Rom 4.5, e fé Cristo, Atos 16.31. Onde surge a fé ela tem um olho em ambos, que operam juntamente na justificação de um pecador.
Foi Cristo que pagou o preço, que cumpriu a justiça pela qual somos justificados, e é Deus que o aceita e o atribui a nós, portanto, a justificação é atribuída aos dois. E isso temos , em Rom 3.24, onde se atribui a ambos juntamente, sendo justificados gratuitamente, por sua graça, por meio da redenção que há em Jesus Cristo.
Estes dois se encontram para nos justificar, assim também a fé em justificação deve olhar tanto para o Pai quanto para o Filho. Então, lemos no versículo seguinte, Rom 3.25, a quem Deus propôs para propiciação, mediante a fé em seu sangue. E embora seja verdade que Deus justifica seja o maior objeto de nossa fé, pois Cristo nos leva pela mão diante do Pai, como vemos em Ef 2.18, e em I Pe 1.21, “que, por meio dele, tendes fé em Deus, o qual o ressuscitou dentre os mortos e lhe deu glória, de sorte que a vossa fé e esperança estejam em Deus.”
2. A segunda é que Cristo deve ser o objeto de nossa fé, em oposição à nossa própria humilhação, ou graças, ou funções.
(1) Nós não confiamos, nem descansamos em Deus na humilhação, como muitos fazem, que têm suas consciências tranquilas nisto, quando estão debaixo de tribulações. Essa promessa, “Vinde a mim, vós que estais cansados e oprimidos, e achareis descanso”, tem sido mal interpretada, porque muitos têm entendido, como se Cristo tivesse falado de paz e descanso simplesmente para esta condição presente, sem nada mais, e assim têm aplicado isto a si mesmos, como lhes dando um interesse em Cristo meramente para achar alívio emocional e sentimental; enquanto que o que está sendo proposto pelo Senhor é apenas um convite (porque eles são muito aptos a ficarem desencorajados) para vir a Cristo, como o único em quem o descanso espiritual pode ser encontrado. Se, portanto, os homens vão estabelecer seu descanso, estando cansados e sobrecarregados, e não vierem a Cristo para isto, eles se sentarão em tristeza.
Assim, se você estiver cansado, você pode ter descanso de fato, mas é preciso vir a Cristo em primeiro lugar. Porque, assim como, se Cristo tivesse morrido apenas, e não tivesse ressuscitado,estaríamos ainda em nossos pecados, 1 Cor 15.17, de modo que nós morremos pelo pecado, (como Paulo cita em Rom 8.11, 12, 18), de modo que se não alcançarmos a ressurreição espiritual pela fé (Fp 3.12,13) permaneceremos ainda em nossos pecados.
(2) Em segundo lugar, não achamos o descanso proposto para as nossas almas, em graças ou deveres; todos eles não podem satisfazer nossas próprias consciências, e muito menos à justiça de Deus. Se a justiça que dá a vida eterna pudesse ter vindo por estes, então Cristo morreu em vão, como se afirma em Gál 2.21.
Que desonra seria para Cristo, que eles devessem compartilhar qualquer parte da glória da Sua justiça! Foram alguns de seus deveres crucificados para você? Graças e deveres são filhos da fé, a descendência de Cristo, e eles podem de fato precisar realmente nutrir a sua mãe, a fé, mas não são a fonte que a gera, senão o próprio Deus, posto que é um dom dele para nós.
3. Em terceiro lugar, a pessoa de Cristo, e não meramente as promessas de perdão, devem ser o objeto da fé. Há muitas pobres almas humilhadas pelo pecado, e arrancadas de seu próprio fundamento, como a pomba de Noé que não tinha onde pousar, eles voam sobre toda a palavra de Deus, para espiar o que eles podem usar para firmar o pé em cima, e achar nela muitas promessas livres e graciosas, para obter o perdão de pecados e justificação, eles imediatamente as agarram e descansam sobre elas apenas, não procurando estar em comunhão com Cristo naquelas promessas. O que é um erro comum entre as pessoas, e é como se a pomba de Noé devesse repousar do lado de fora da arca, e não vir ter com Noé no interior da arca, onde ela poderia descansar, mas se ela ficasse do lado de fora, enfrentando todas as tempestades, certamente teria morrido lá no final.
Mas podemos observar que a primeira promessa que foi dada, não foi uma palavra apenas prometendo perdão, ou outros benefícios que Deus iria conceder, mas foi uma promessa da própria pessoa de Cristo como vencedor de Satanás, e para comprar aqueles benefícios como a semente da mulher que deve esmagar a cabeça da serpente.
Então, quando a a promessa foi renovada com Abraão, não foi uma promessa de bênção e perdão, mas daquela semente, isto é, Cristo (como se vê em Gál 3.16), em quem essa bênção foi cumprida. Em tua semente todas as nações da terra serão abençoadas. Assim que a fé de Abraão primeiro foi selada com Cristo na promessa, e, portanto, se diz ter ele visto o dia de Cristo e ter se regozijado em abraçá-lo. E assim todos os patriarcas sucessivos (que eram crentes) se, mais ou menos, em seus tipos e devoções, como aparece em 1 Cor 10.1,2. E se, eles o fizeram, muito mais devemos nós, portanto, olhar para Cristo, para Aquele que agora existe em nosso relacionamento com ele, não somente em promessas, mas tendo realmente encarnado, e que agora se encontra no céu. Assim, todas as promessas, como a de perdão, etc, são ratificadas e confirmadas nele.
Agora há a mesma razão quanto às promessas, para aqueles que pregam o evangelho, porque devem pregá-lo com um olho na promessa ouvida ou lida, enquanto a alma deve primeiro olhar para Cristo, e abraçá-lo sabendo que as promessas são por meio dele, e é nele que elas têm o sim e o amém, 2 Cor 1.20.
A promessa é, senão a caixa, e Cristo a jóia nela, a promessa é o campo, e Cristo a pérola escondida nele.
As promessas são os meios pelos quais você crê, e não as coisas em que você deve descansar. E assim, embora olhe para a promessa do perdão, você deve crer em Cristo, em quem essa promessa de perdão é obtida. Assim lemos em Atos 26.18, o próprio Cristo afirmando que os crentes obtêm o perdão pela fé nele.
Não devemos conceber que as promessas de perdão sejam como os indultos de um príncipe, que contêm apenas uma expressão de sua palavra real para o perdão, de modo que a busca de descanso tem a ver apenas com a sua palavra, mas as promessas de perdão de Deus são feitas em seu Filho, e é como se um príncipe devesse se oferecido a si mesmo para perdoar um traidor.
“Aquele que tem o Filho tem a vida.”, 1 João 5.12, porque a vida designada por Deus está somente nele, 1 João 5.11.
Assim, descansar apenas na promessa, ou olhar para o benefício prometido, sem olhar para Cristo, não é uma fé evangélica, mas a fé judaica. É ir a Deus sem um Mediador eficaz, e isto é fazer com que as promessas do evangelho sejam como as promessas da Lei. Por isso temos afirmado na Palavra que as promessas do evangelho estão baseadas numa superior Aliança, e que estas promessas são superiores às da Lei, Heb 8.6.
Há três tipos de promessas, e na aplicação de todos estes tipos, é Cristo que a sua fé deve contemplar.
1. Há promessas absolutas, feitas sem condições, como quando é prometido que Cristo viria ao mundo para salvar os pecadores, etc.
2. Há promessas convidativas, como a que antes mencionamos: “Vinde a mim vós que estais cansados,” etc. A promessa não é sobre cansaço, mas para se chegar a Cristo, segundo a ordem de irmos a ele, e a consequência será que encontraremos descanso e paz para a alma.
3. Há promessas asseguradas, como aquelas feitas para as diversas qualificações da santificação, etc. Mas ainda assim o que é que está prometido nelas, qual é o coração que somente deve ser olhado? É Cristo, no qual a alma descansa e tem conforto.
Tradução, redução e adaptação feitas pelo Pr Silvio Dutra, de um texto de Thomas Goodwin, em domínio público.