Uma característica muito interessante das antigas mitologias pagãs é a existência da dualidade, “como vimos no Zoroastrismo” da eterna força entre o bem e o mal lutando uma contra a outra.
Esta é praticamente uma constante nas tradicionais mitologias Grega e subsequente Romana, mas também é fato – ainda mais fundamental – nas mitologias Nórdicas, por exemplo, e até em mitologias indígenas regionais, as pessoas entendem com facilidade estas relações dualistas, como branco versus preto, dia versus noite, morte versus vida, nós versus eles, Deus versus diabo e a que mais nos inquieta é a visão da luta do bem contra o mal. E um universo cheio de coisas evidentemente más e aparentemente sem sentido, mas que ao mesmo tempo contém criaturas como nós, que têm a consciência dessa maldade e desse absurdo.
Existem só dois pontos de vista que conseguem contemplar todos esses fatos. Um deles é o cristianismo, segundo o qual estamos num mundo bom que se perdeu, mas que ainda assim conserva a memória de como deveria ser. O outro ponto de vista chama-se dualismo. Dualismo é a crença de que, na raiz de todas as coisas, há duas forças iguais e independentes, uma delas boa, a outra má. O universo é o campo de batalha no qual travam uma guerra sem fim. Creio que, ao lado do cristianismo, o dualismo é a crença mais viril e
sensata existente no mercado. Porém, traz em si uma armadilha.
Os dois poderes, ou espíritos, ou deuses – o bom e o mal – são tidos como independentes um do outro. Ambos existem eternamente. Nenhum deles gerou o outro, nenhum deles tem mais direito que o outro de chamar a si mesmo de “Deus”.
Cada um deles, presumivelmente, considera a si mesmo o Bem, e ao outro, o Mal. Um deles aprecia o ódio e a crueldade; o outro, o amor e a misericórdia; e cada qual sustenta sua própria visão das coisas. No entanto, o que temos em mente quando chamamos um deles de Poder Benigno, e o outro, de Poder Maligno? Talvez queiramos dizer simplesmente que preferimos um ao outro — como alguém pode preferir uma cerveja a um
vinho doce; ou então queiramos dizer que o que quer que cada um deles pense a seu respeito, e independentemente de nossas preferências humanas imediatas, um deles está efetivamente errado, enganado ao se considerar benigno. Ora, se tudo o que queremos dizer é que preferimos o primeiro poder, temos de desistir definitivamente dessa conversa de Bem e de Mal, pois o Bem é aquilo que devemos preferir quaisquer que sejam os nossos sentimentos momentâneos. Se “ser bom” significasse apenas aderir ao lado que por acaso nos agrada, o Bem não mereceria ser chamado assim. Logo, o que queremos dizer é que um dos poderes está errado, enquanto o outro está certo.
Mas no momento em que dizemos isto, insere-se no universo um terceiro fator, distinto dos outros dois poderes: uma lei, ou padrão, ou regra geral do Bem à qual o primeiro poder se submete, e o outro, não. Se os dois poderes são julgados por esse padrão, então o próprio padrão ou o Ser que o criou está além e acima de qualquer um dos poderes. E ele o Deus verdadeiro. Na realidade, quando dizemos que um poder é bom e o outro é mau, entendemos que um está em relação harmoniosa com o Deus verdadeiro e supremo, e o outro, não.
Quando as pessoas, mesmo as cristãs, atribuem o bem a Deus e o mal a Satanás, elas estão afirmando a heresia do dualismo. Este ensina que Deus e o diabo são poderes independentes, como se fossem dois titãs lutando igualmente pelo domínio do universo.
Muitos cristãos, por causa dessa cosmovisão dualista, pensam que Satanás hoje está no controle porque o mal anda prevalecendo. Algumas pessoas creem nesse tipo de dualismo porque tentam proteger de Deus e tornar a crença deles mais fácil de ser absorvida. Tentam evitar que Deus, de alguma forma, esteja ligado à presença do mal no mundo. Fazendo isso, isto é, atribuindo toda a responsabilidade final do mal a Satanás, tornam a crença do aparecimento do mal uma doutrina mais digerível. Obviamente, é muito mais fácil pensar em Deus como o “sumo bem” e de Satanás como o “sumo mal”. Ainda que
essas pessoas consideram o primeiro mais forte e mais poderoso que o segundo, não é assim que a Escritura apresenta o quadro do governo do mundo.