As palavras de Jó no 13º capitulo do seu livro são aterrorizantes para todo conselheiro cristão precipitado no falar e no julgar, e que se faz a si mesmo, mensageiro e conselheiro de Deus, quando não foi por Ele enviado para atender a determinada situação específica.
Tal como os amigos de Jó não haviam sido levantados por Deus para aconselhá-lo e lhe dizerem tudo o que lhe falavam em Seu nome.
Jó não estava se rebelando contra a palavra de Deus na boca de seus amigos, mas contra a palavra de homens proferidas em nome de Deus.
Deste modo, não poderiam produzir o efeito que seria esperado naquela situação, que seria o de consolá-lo.
Ao contrário, só serviram para aumentar ainda mais a sua aflição.
Aquilo foi permitido por Deus para mostrar a que ponto podem chegar as nossas aflições neste mundo. Porque não somente o mal que nos é lançado diretamente pelo diabo nos aflige, como também o mau juízo dos homens, ainda que proceda de nossos familiares ou amigos.
Está determinado pelo conselho eterno de Deus, que o justo sofrerá perseguições, e estas lhe sobrevirão de variadas formas.
As acusações dos amigos de Jó, eram apenas uma das muitas facetas das aflições que temos que sofrer neste mundo, quando permitidas por Deus.
Não importava a Jó se defender perante os homens, mas perante Deus.
Tal como Paulo fizera em seus dias dizendo que pouco lhe importava ser julgado por tribunal humano, mas sim em ser julgado pelo Senhor, porque é a Ele que devemos dirigir a nossa causa e defesa.
O homem não está qualificado para julgar estas demandas espirituais que nos sobrevêm segundo a vontade de Deus, para propósitos específicos.
Então não será na terra que acharemos o fórum legítimo e adequado para serem julgadas as nossas causas espirituais, senão somente no tribunal divino, o qual ainda se manifestará para recompensar a cada um segundo as suas obras. Somente então haverá um julgamento preciso, claro, aberto, perfeito, de tudo o que passamos neste mundo.
Por isso Deus não tem constituído advogados humanos neste mundo para defenderem as nossas causas espirituais. Somente Cristo é o Advogado que nos tem sido dado, e é portanto, somente a Ele que devemos recorrer para apresentar as nossas causas, especialmente, as relativas às nossas aflições.
Quando o homem se propõe a fazer o papel de advogado, que é exclusivo de Cristo, fatalmente errará, porque Deus não lhe revelará as causas e os propósitos das aflições pelas quais nos faz passar neste mundo, senão somente a Seu Filho Jesus Cristo, que é nosso Advogado no céu.
Os que temerariamente se colocam nesta posição de advogados funestos, que não foram constituídos por Deus, caem fatalmente, na condição expressada nas seguintes palavras de Jó:
“7 Falareis falsamente por Deus, e por ele proferireis mentiras?
8 Fareis aceitação da sua pessoa? Contendereis a favor de Deus?
9 Ser-vos-ia bom, se ele vos esquadrinhasse? Ou zombareis dele, como quem zomba de um homem?
10 Certamente vos repreenderá, se em oculto vos deixardes levar de respeitos humanos.
11 Não vos amedrontará a sua majestade? E não cairá sobre vós o seu terror?”
Jó havia perdido a esperança de continuar vivo. Ele estava convicto em sua aflição que Deus o mataria, mas ainda assim, quando comparecesse na presença de Deus, defenderia o seu modo de caminhar diante dEle (v.15).
Ele tinha real comunhão com Deus. Ele andou em todos os Seus caminhos. Sua devoção era sincera, e a graça de Deus operou poderosamente em sua vida, dando-lhe integridade e retidão, e também o temor do Senhor que lhe fazia sempre se desviar do mal.
Ele estava desejoso portanto de comparecer em juízo para defender os seus caminhos diante do tribunal do Senhor.
Ele sabia que Deus é justo Juiz. Que julga os Seus filhos com misericórdia, e que não é implacável na aplicação da justiça, porque não lançará em rosto faltas que foram anteriormente perdoadas.
Jó conhecia o caráter de Deus por experiência, por viver em intimidade com Ele, ainda que lhe faltasse muitas coisas a serem conhecidas relativas ao Seu caráter, conforme ele viria a expressar no final do seu livro, depois de tê-las aprendido em meio a tudo o que havia sofrido.
Contudo, mesmo nos dias da sua aflição, Ele jamais abandonara a sua confiança no Senhor e na Sua justiça e misericórdia. Por isso não apelava para homem algum, senão somente para o Senhor, porque sabia que seria julgado com equidade e misericórdia, e consoante uma perfeita e imparcial justiça. Justiça esta, muito diferente da justiça dos homens que é cheia de parcialidade, de imperfeições, de acusações injustas, de falsidades, e de motivações incorretas.
Ele poderia dizer juntamente com Davi na hora do juízo: “Caiamos nas mãos de Deus porque são muitas as suas misericórdias, mas nas mãos dos homens não caiamos nós.”
Era justamente a esta expressão de sentimentos que ele estava se referindo neste 13º capítulo do seu livro.
Um incrédulo ímpio não poderia ter a mesma confiança que Jó tinha em relação ao juízo divino.
Todo cristão sincero, tal como ele, tem a mesma confiança, não porque confie na sua própria justiça, mas por saber que há um Deus justo que julga segundo a Sua graça e misericórdia a todo aquele que confiou nEle, e nesta Sua graça e misericórdia, para que fosse salvo da condenação eterna.
Por isso Jó podia dizer que:
“Eis que já pus em ordem a minha causa, e sei que serei achado justo:” (v. 18)
Nos versos 19 a 28, Jó expressa em belas palavras, qual é o sentimento do justo em relação a Deus quando em grande aflição.
Ele não quer ouvir palavras de acusação, como estavam fazendo os seus amigos, mas simplesmente deseja que Deus dê alívio ao seu espírito, que lance para longe os terrores que amedrontam a sua alma. Que possa ver a face do Senhor, sentir a Sua presença.
Poder ouvir a voz do Senhor e falar com Ele em oração, sem um espírito transtornado pela aflição. Porque a alma não foi feita para o transtorno senão para a paz com Deus, e não pode portanto, estar sossegada, quando longe do seu lugar de repouso, que é o próprio Senhor.
O sentimento de que possa haver alguma falta ou pecado em nós que tenha quebrado nossa comunhão com Deus é algo terrível para ser suportado por um justo tal como era Jó.
O pensamento de que haja pecados ocultos que produziram tal quebra de comunhão é algo insuportável, e a alma não achará descanso enquanto não experimentar de novo a aprovação do Senhor, que é percebida pela Sua presença e mover do Seu Espírito em nós.
Era isto que estava sendo ocultado de Jó, que não lhe estava sendo concedido em sua aflição, e era por esse motivo que sua alma gemia e derramava palavras de amargura em seus lábios; porque sabia que não poderia estar consolado enquanto não fosse restaurada a manifestação da presença do Senhor no seu coração.