As feridas de Jó estavam sangrando e a sua dor não cessava, no entanto, nenhum dos seus amigos trouxe óleo ou bálsamo para aliviá-lo, ao contrário estavam lançando vinagre sobre a sua alma, afligindo-o ainda mais, como também fez Zofar no 11º capítulo, acusando-o de pecados que ele não havia cometido.
Não podemos esquecer do testemunho que o próprio Deus havia dado sobre Jó, antes de permitir que o diabo o afligisse, de que era homem reto e íntegro, temente a Deus e que se desviava do mal.
Deus estava contente com Jó e se regozijava nele.
Portanto, não era por nenhuma iniquidade que tivesse praticado que lhe sobreviera todo aquele sofrimento.
Ele não estava sendo castigado ou corrigido por Deus.
Como vimos nos dois primeiros capítulos, a causa do sofrimento de Jó, é que Deus permitira ao diabo que a sua fé fosse provada.
Quanto a isto, Jó não é um caso isolado, porque todos os cristãos são provados, especialmente aqueles que são mais fiéis ao Senhor, para que sejam mais santos ainda.
A vocação do justo é se tornar mais justo ainda, conforme palavras de nosso Senhor no final do livro de Apocalipse, e este progresso em justiça é forjado pelas provações.
Certamente, é isto o que incomoda a muitos, tal como havia incomodado aos amigos de Jó.
Eles bem conheciam a sua reputação de homem sábio e justo.
A justiça, a misericórdia e a bondade de Jó, superava em muito a deles, tal como a dos cristãos supera a dos escribas e fariseus.
Isto gera, de modo sutil e muitas vezes de modo encoberto aos olhos daqueles que são por ela tomados, inveja espiritual daqueles que se aproximam em graus elevados ao próprio caráter de Deus.
Isto é o que os torna diferentes e que lhes faz alvo da perseguição de outros.
Podemos dizer, portanto, que o que os amigos de Jó estavam fazendo era uma perseguição espiritual. Um ataque de revanche motivado pela inveja.
Eles não perderiam a oportunidade de tentar convencer Jó que não era tão justo e santo quanto pensava ser.
Ainda que nada tivessem algo para acusá-lo diretamente, eles atacariam a sua reputação com ruins suspeitas e acusações vazias, insinuando que abrigava iniquidade no seu coração.
Aproveitando-se do seu estado de fraqueza e miséria extremas, sentindo-se superiores a ele, porque não se encontravam nas mesmas condições, agiram como conselheiros, só que conselheiros molestos e implacáveis, a pretexto de estarem buscando o bem de Jó, repreendendo-o e lhe rogando que se humilhasse diante de Deus reconhecendo e confessando os seus pecados.
Isto não é algo incomum de ser visto ainda em nossos dias.
Basta que algum irmão em Cristo comece a andar no caminho da justiça, e a se consagrar de modo efetivo a Deus, e em sendo permitido pelo Senhor que seja provado em sua fé, vindo a sofrer perdas e dores, que logo o acusarão de hipócrita e de orgulhoso espiritual, tal como os amigos de Jó estavam fazendo com ele.
Zofar não aceitou a alegação de Jó de que a sua doutrina era pura, assim como estava limpo de culpa aos seus olhos, e julgou que isto era o orgulho espiritual que lhe estava trazendo aquela ruína, que segundo zofar ainda era pequena, em face do que merecia a iniquidade de Jó.
Segundo Zofar, como Jó poderia se considerar justo aos olhos de Deus, se não há nenhum mortal que possa se comparar à profundidade da Sua justiça, santidade e poder?
Como poderia o homem descobrir estas profundezas de Deus, para ser igual a Ele?
Zofar não sabia no entanto, que o homem não foi criado à imagem e semelhança de Deus, para lhe ser igual em conhecimento e em poder, mas em santidade.
Deus não justificará portanto a quem Lhe for igual em conhecimento. Ou que Lhe seja igual em poder, porque isto é algo impossível de ser obtido pelo homem.
Mas justificará a todo aquele que detestar o pecado, e crer que Ele é poderoso para santificá-lo gradualmente, até que atinja a plenitude desta santidade na glória.
Os amigos de Jó julgavam que lhe faltava tal santidade, porque pensavam que ele havia voltado as costas para Deus, e que entrara em contenda com o Criador, pelo que depreenderam das palavras de amargura que saíam da sua boca, por causa da sua grande aflição.
Tão grande era a falta de empatia deles com o grande sofrimento de Jó, tão grande era a falta de misericórdia e sensibilidade, que não puderam atinar com o fato de que o homem que se encontra grandemente debilitado haverá de pronunciar palavras de amargura em algum grau, porque nisto aprende que nada é sem a assistência da graça do Senhor. E é principalmente esta lição que Deus pretende nos ensinar em nossas aflições.
Quantas queixas e lamentos encontramos nos Salmos de Davi, e dele se diz ter sido um homem segundo o coração de Deus. Ele não recebeu nenhuma repreensão da parte do Senhor por causa disto. Ao contrário, fez com que suas palavras fossem registradas, para que aprendêssemos que no maior dos valentes, no maior dos santos, há muito gemido e dor, quando nos sentimos desamparados pela graça do Todo-Poderoso. E que é nosso dever clamar das profundidades da nossa alma, até que Ele se levante em nosso socorro, porque se compadecerá da alma aflita, que reconhece que é fraca e nada sem Ele.