A questão apresentada no 14º capitulo de Romanos quanto ao ato de não comer ou beber aquilo com que possa se escandalizar nosso irmão é diferente em ordem da que foi apresentada nas epístolas dirigidas aos Coríntios, porque o problema nesta igreja dizia respeito a se comer carne sacrificada a ídolos.
Aqui neste décimo quarto capítulo, o problema era de outra natureza, diferente do citado em I Coríntios, porque estava relacionado ao fato das distinções cerimoniais da Lei de Moisés sobre alimentos puros e imundos, e também sobre as libações e comidas que acompanhavam os sacrifícios apresentados no templo de Jerusalém, e não propriamente a prática de idolatria como estava ocorrendo em Corinto.
Uma coisa é a predileção por gostos ou práticas particulares ou de grupos, diferentes dos nossos, e que devemos suportar em amor para não quebrar a unidade do corpo de Cristo, conquanto tais gostos e práticas não ofendam a norma bíblica, não se tratando de heresia, idolatria ou má conduta, e outra muito diferente quanto o que se encontra em questão é a conivência com qualquer forma de mal.
Paulo demonstra que ninguém seria recomendado ao reino de Deus pelo ritualismo cerimonial de distinções de alimentos impostas no regime da lei no Velho Testamento, e nem se deveria por outro lado, se atacar aos judeus que ainda guardavam tais costumes.
Por isso, é dito que aquele que come não julgue o que não come, e o que não come também não julgue o que come, porque afinal não é nisto que consiste o reino de Deus, mas em justiça, paz e alegria no Espírito Santo, como se vê no verso 17 de Rom 14.
Além disso, os judeus estavam acostumados a guardarem dias festivos conforme determinados pela lei, e que agora em Cristo já não eram mais exigidos por Deus.
Então, quando um cristão judeu afirmava a importância de se guardar tais dias para se agradar a Deus a um gentio, ele estava errando, do mesmo modo que estaria errando os gentios que os condenassem por estarem ainda guardando aqueles cerimoniais da lei, aos quais estavam apegados por dever de consciência e tradição, como se vê nos versos 5 e 6.
Foi somente em relação a esta questão de comer ou não certos alimentos, e de se guardar dias sagrados assim considerados pela lei, que Paulo disse que cada um deveria ter uma opinião bem definida em sua mente.
Ele restringiu o fato de cada cristão estar inteiramente seguro em sua própria mente, apenas a esta questão cerimonial de alimentos e dias sagrados segundo os judeus; para que ninguém tentasse impor aos outros o seu próprio ponto de vista.
Por isso, o apóstolo disse que em Cristo já não havia mais nenhuma distinção entre alimentos puros e imundos. Na verdade Ele não tem considerado mais nenhum alimento imundo, mas se alguém quisesse continuar assim considerando que o considerasse, mas que o fizesse para si mesmo, sem condenar ou rejeitar os demais de pensamento diferente.
Deste modo, ao dizer no verso 14 que estava bem certo no Senhor Jesus que não há mais nenhuma coisa de si mesma imunda, a não ser para aquele que a tem por imunda, ele não estava de modo algum dizendo que tudo o que existe no mundo é puro; porque estava restringindo o uso desta expressão apenas aos alimentos que comemos.
Paulo aproveitou para estender a questão sobre a comida e bebida, para além do cerimonialismo e aplicou-a ao fato de se comer e beber de maneira escandalosa, que sirva como pedra de tropeço para alguns irmãos (v. 20 a 23).
Assim, em vez de estarem preocupados em julgarem seus irmãos quanto a estas coisas não essenciais, eles pecavam contra o Senhor, esquecidos que, cada um dará conta de si mesmo a Deus, no Tribunal de Cristo.
Evidentemente, podemos e devemos transferir tudo isto para a nossa forma de nos relacionar com irmãos que pertençam a congregações cuja prática cultual seja diferente da nossa, quanto ao gosto musical, ordem de culto, forma de ministração da Palavra de Deus, etc, uma vez que não somos autorizados pelas Escrituras a evitar ter comunhão com eles por conta de nossos gostos serem diferentes.
Nossos modos e costumes não são um padrão de verdade nem para nós mesmos, porque estão sujeitos a serem alterados com o tempo. Faríamos bem, portanto, em aprendermos simplicidade, humildade, amor, renúncia, por amor aos irmãos e ao Senhor, negando-nos a nós mesmos quanto aos nossos gostos em prol de não sermos uma causa de tropeço ou de tristeza para os nossos irmãos.
Caso alguém não consiga fazê-lo, que se guarde então de criticar aqueles que Deus não tem rejeitado por conta de seus costumes diferentes dos nossos.