É forçoso reconhecer mas muito da exposição teológica sempre polarizou nos extremos do legalismo ou do liberalismo. E isto pode ser explicado pela propensão de muitos expositores para um ou outro lado. Todavia, não há na Bíblia qualquer enfoque em nenhum dos dois extremos referidos, porque ela a expressão e revelação do amor e da misericórdia que há no próprio Deus, e isto mesmo no período chamado de dispensação da Lei (Velho Testamento), e não poderia ser diferente disto porque toda a Bíblia foi produzida por inspiração do Espírito Santo.
O modo legalista de pensar conduz a auto-condenação, inquietação e desespero, mesmo naqueles que não estão mais debaixo da lei, mas da graça, e isto sucede porque toda a base do relacionamento do legalista com Deus consiste na ideia da recompensa do acerto e do castigo do erro. Deus é visto como um algoz pronto a punir severamente qualquer falha em pensamento, atitude ou comportamento, considerado à luz da própria interpretação do legalista, segundo a sua maneira de entender a Palavra de Deus.
Para fugir deste sentimento de condenação, inquietação e desespero, o liberal caminha no sentido oposto e procura suprimir de sua consciência qualquer ideia relativa a disciplina corretiva divina e usa o argumento da graça para justificar como aceitável a Deus qualquer tipo de comportamento.
A primeira forma de pensar – legalista – denigre o amor, bondade e misericórdia de Deus, e a segunda – liberal – desonra o juízo, a justiça e a verdade divinas. É certo que Deus detesta e pune o pecado, mas também é certo que ele perdoa e usa de misericórdia para com os penitentes.
Algum pai terreno se disporia a ferir na face um filho que se achegasse a ele com humildade lhe confessando alguma falta que houvesse cometido? Se nós sendo maus não o fazemos, por mais amantes que sejamos do juízo e da justiça, quanto mais não o fará o Pai que é todo misericórdia?
Se o Senhor tratasse com a humanidade dando-lhe o pago imediato por todas as transgressões de seus mandamentos e vontade, certamente não restaria qualquer ser humano na terra, como também no céu. Esta verdade deveria servir para repensar as formas de pensamento teológico que ou vê em Deus um carrasco, ou então um alienado em relação ao homem que Ele criou.
Por certo não é uma tarefa fácil, porque isto depende de revelação e instrução do Espírito Santo, em infusão de sabedoria espiritual e celestial para um correto discernimento da pessoa de Jesus Cristo e da forma como ele se relaciona conosco e o modo que espera que nos relacionemos com ele. Por pressuposto básico, não há quem não peque. Todavia, Deus não se agrada que demos livre acolhida a um modo de viver pecaminoso.
Assim, uma coisa é pecar enquanto se possui uma mente que detesta o pecado, e que aspira mortificá-lo, por ações práticas dirigidas neste sentido e que contam com a assistência da graça de Jesus e do poder do Espírito Santo. E outra, muito diferente, é pecar enquanto se permanece amando o pecado, e sem ter o devido cuidado ou preocupação em mortificá-lo, por se considerar que isto não seja necessário.
É certo que os do primeiro grupo poderão contar com o favor e a ajuda de Deus para viverem do modo que lhe seja agradável, e quanto aos do segundo grupo não será mostrado qualquer favor ou ação da graça, enquanto mantiverem a citada posição. Estou bem certo que a falta de uma correta exposição da verdade bíblica por parte daqueles que pregam, ensinam ou escrevem sobre temas teológicos, é um dos grandes fatores contribuintes para a formação destes tipos de mentalidades incorretas e que conduzem a um viver religioso que pouco contribui para o progresso do Evangelho, quanto são danosas à paz e saúde espiritual dos que permanecem debaixo dessa visão teológica incorreta e inadequada.
Não se pode resumir o todo da vida cristã em pensamentos como os destacados a seguir:
“Se eu transgredir um mandamento, ainda que involuntária ou casualmente, serei castigado por Deus e perderei a sua bênção.”
Estes costumam se esquecer do perdão, da misericórdia, do amor de Deus e do poder do sangue de Jesus para nos perdoar e purificar, se tão somente lhe confessarmos os nossos pecados e nos dispusermos a abandoná-los.
“Quando eu peco, não me preocupo nem um pouco, porque sei que a morte de Jesus no meu lugar já pagou por todas as minhas transgressões.” É verdade que a dívida foi paga completamente, mas para um viver presente agradável a Deus, devemos fazer valer o poder do sangue que Jesus derramou na cruz, para produzir em nós um viver santificado, para que não sejamos mais conduzidos pelo pecado, por manter esta atitude errada de sempre justificá-lo.
Jesus morreu para nos libertar do pecado, e não para que permanecêssemos nele.
O Senhor trabalhará pacientemente em nós, para nos conduzir ao conhecimento pleno da Sua Pessoa e vontade, e muito contribuiremos com o Seu trabalho, caso nos empenhemos em conhecer a verdade relativa à nossa completa miséria espiritual que pode ser enriquecida somente em Cristo e por Cristo, porque somos inteiramente dependentes da Sua graça para expressarmos o modo de viver e se comportar que é de nós esperado por Deus.
Nosso Senhor morreu por amor a nós, para que nos deixasse uma herança eterna que jamais poderá murchar ou acabar. E quem não gostaria de ser um herdeiro da maior riqueza que jamais foi possível ao homem natural sequer imaginá-la, quanto mais conhecê-la ou recebê-la?
Todavia, os que são de Cristo, ainda que imperfeitos, ou que não demonstrem grande progresso no conhecimento adequado da Sua Pessoa e vontade, são herdeiros juntamente com Ele, pois esta é a profundidade da graça que nos está sendo oferecida por Ele, que requer de nós tão apenas que reconheçamos a condição da nossa necessidade, pecadores que somos, e que nos disponhamos a permitir-lhe o trabalho relativo à nossa santificação, porque ainda que nos esteja sendo oferecido um céu, nada e ninguém poderá estar lá e herdá-lo se não for santo assim como o Senhor é Santo.