“Quem de vocês estiver sem pecado que atire a primeira pedra”. Essa conhecida proposta dita por Jesus aos fariseus resume bem uma verdade que não podemos negar: todos pecamos. Apesar de regenerados, de obtermos nova vida em Cristo, há ainda a luta diária e constante contra o pecado. Ora o resistimos, ora somos vencidos. Por vezes caímos em pecados infantis, grosseiros e, não poucas vezes, chegamos à mesma constatação do Apóstolo Paulo: o que queremos fazer, não fazemos. Mas o que não é para ser feito, isso fazemos. Não adianta: somos carentes da Graça.
Apesar disso, não podemos negar também que essas experiências nos tornam mais maduros e o que se espera é que na próxima batalha, mesmo que a anterior tenha sido desastrosa, estejamos mais fortes e resistentes ao pecado. A questão que quero abordar é a maneira como lidamos com nossos pecados e confrontá-la com o que a Bíblia nos recomenda, uma vez que não é raro o caso de cristãos, que experimentaram a verdadeira conversão, prostrados diante da culpa do pecado. De uma coisa podemos ter certeza: o pecado consumado não é o fim da linha. A porta da Graça está aberta e do outro lado nos espera o pai de braços abertos oferecendo-nos outra chance. Eu quero citar três úteis etapas para lidarmos com o pecado, uma vez que ele foi consumado. Tudo baseado na segurança de que Cristo é quem nos justifica.
A confissão é o grande inicio para o pecador arrependido. É de se lamentar que essa prática esteja em baixa em nossas igrejas, que priorizam declarações de uma falsa força e poder, com atos e determinações, quando, na verdade, não passamos de débeis pecadores. A introdução de práticas nada bíblicas em nossos cultos tem escondido uma das mais contundentes declarações do Evangelho a nosso respeito e tem dificultado nosso acesso à Graça. Para os que desconhecem sua própria condição, a Graça torna-se sem função. Com isso, o que se vê são crentes desesperados por desempenho, inseguros e temerosos por uma possível queda.
Confessar, antes de tudo, é um exercício de autoreconhecimento e profundo pesar. Nele somos confrontados com nós mesmos. É como a fofoca. No entanto, nele falamos mal de nós mesmos. Nós somos a vítima e os nossos erros, hipocrisia e mentiras são o assunto. Tudo isso perante nós mesmos e Deus. Somos desnudados e toda a máscara cai. Apesar de doloroso, não há meio melhor para o tratamento dos nossos pecados pois ele gera contrição e a Bíblia nos garante que o Senhor ama isso. E é possível afirmar que o verdadeiro filho de Deus anseia por fazê-lo, pois confia no Pai (Sl 32: 3-5) e no seu perdão ( 1 Jo 1). Mesmo com pregações estranhas do Evangelho e com pessoas atendendo a apelos que elas mesmas nem sabem, o requisito da aceitação da mensagem de salvação continua sendo a real noção de pecado e a necessidade de redenção.
“O reconhecimento do pecado é o início da salvação” – Lutero
A certeza do perdão é a segunda e mais problemática ação. Eu digo problemática pelo que comumente erramos. Não são poucos os que confessam seus pecados, entendem a destruição que ele provoca, mas deparam-se com a enorme dificuldade em encontrar refrigério para suas almas. Vivem por tempos de forma melancólica, cabisbaixos e com um terrível sentimento de culpa, tanto perante Deus, quanto perante homens. Há alguns até que pregam esse estilo, como se fosse salutar.
A evidência do perdão não carece de eventos externos, de profetas enviados diretamente ao pecador, de revelações, de tratamentos, de raios, trovoadas ou o que for. Ele provém da Cruz (I Pedro 3:18; II Coríntios 5:21; Hebreus 9:12, 26). Essa deve ser a visão do filho de Deus. Seu refrigério e regozijo estão no fato de Cristo tê-lo substituído na Cruz, o livrado do pecado e garantido perdão. Isso é muito sério, pois está diretamente ligado à nossa comunhão. Se isso não estiver claro, fatalmente o cristão encontrará dificuldades na caminhada, com um relacionamento inseguro e cheio de medos para com o Pai. Essa postura não denota humildade, mas um enorme desconhecimento das garantias que temos em Cristo.
É muito importante que isso fique claro para os que, ao pecar, encaram isso como um fato estranho (não me refiro a pecados específicos, mas ao ato em si) e, como Adão, se escondem de Deus por terem pecado. “Ele conhece a nossa estrutura e lembra-se de que somos pó” ( Sl 113:4).
Por último, a restauração. Dos três, esse é o mais polêmico e extremamente heterogêneo ao longo do corpo, uma vez que há diferentes maneiras, bíblicas ou não, das quais se valem para tratar o pecador (Gl 6:1,2). Há casos em que o mesmo se vê exposto diante de um severo e acusador tribunal, quando, na verdade, o perdão e a exortação deveriam ser elementos de tratamento. Sendo assim – já presenciei muito isso – a mudança de congregação ou, lamentavelmente, o abandono da fé, tornam-se possibilidades irresistíveis.
Talvez a maior evidência de que falhamos nisso é a maneira como o “mundo” vê a igreja. Não são raros os comentários de que ela foi feita para “perfeitos” e “santos”, no sentido pejorativo da palavra. Sem entrar na questão teológica dos seus significados, não é por esses tipos de pessoas que a Igreja é composta. Pelo contrário, nela essas pessoas não existem.
O que não podemos perder de vista é justamente o fato de que o Evangelho é para pecadores e seu principal objetivo é a restauração deles, isto é, o retorno à comunhão com o Redentor (Lc 5:31,32; 1 Tm 1:15). É compreensível que isso possa levar tempo e envolver pessoas, principalmente as que foram diretamente afetadas pelo pecado de outrem – sim, o pecado individual é um problema do corpo também – mas a restauração do pecador perante os demais deve ser o objetivo principal do corpo em que está inserido. Isso é a aplicação direta da graça. Não podemos nos esquecer de que o maior benefício da Obra de Cristo foi a nossa imediata e plena restauração, com redenção, regeneração e justificação.
Portanto, para você que se encontra estagnado, mesmo tendo confessado e sido perdoado, deixo minha recomendação: siga em frente. Retorne, com a devida orientação e apoio do seu pastor e líder, confiando sua vida a Jesus, às primeiras obras. Glorifique a Deus, dê testemunho da obra da redenção em você.
Certamente uma das maiores demonstrações da graça sobre a Igreja é que um dos seus mais importantes líderes foi justamente o que negou Jesus.
Conclusão
Pelo menos duas verdades ficam evidentes na declaração de Jesus que citei no início: primeiro, não possuímos direito de definir se o irmão tem ou não direito ao perdão. Segundo, Jesus busca pecadores. Essa segunda fica ainda mais clara em várias parábolas, quando Deus – Ele mesmo – é comparado ao pai que sofre pelo filho perdido; ao pastor de ovelhas que não mede esforços em busca do que se havia perdido.
Por isso, de todas as justificativas dos que abandonam Cristo, a que se apóia no fato de sermos pecadores, sob a ótica do Evangelho, é a mais absurda. Foi por esse motivo que o Filho de Deus se fez homem, morreu e ressuscitou. E é por esse motivo que fora dele não há possibilidade de salvação. Somos pecadores, o Pai sabe disso e nos oferece sua Graça como remédio a nos ensinar a seguir em frente com Ele, dia após dia ( Ef 2:10; Tt 2:11-13).
Em Cristo,