Na década de 1990, a maioria de nós pôde acompanhar o fenômeno da música gospel no Brasil. Vivíamos uma época em que fazer música evangélica contemporânea era tudo de bom. Grupos gospel estavam na crista da onda (desculpem-me a gíria um tanto antiquada). Esse foi um período de descoberta. Havia o mérito daqueles que utilizavam os mais variados estilos musicais para evangelizar os ‘perdidos’. Foi nesse mergulho cultural que surgiram, nos redutos cristãos, muitas tribos ‘urbanas na quase totalidade’ em que jovens encontravam sua identificação religiosa sem ter que abdicar da sua identidade pessoal e de sua opção estética.
O sonho de muitos jovens dessa geração era formar sua banda de garagem (ou melhor, de igreja) e sair por aí fazendo shows e evangelizando. Sem, no entanto, abrir mão da postura politicamente correta: nada de sexo e de drogas. Tudo de rock’n roll. A sinceridade desses jovens era incontestável. Especialmente para aqueles que puderam viver ou acompanhar tudo de perto. Mas como a vida costuma ser cruel quando se trata de verdades inexoráveis, o joio se misturou ao trigo. Criou-se a ‘cultura’. E o ‘mercado’ veio a tira-colo. Com o mercado, naturalmente, o que era bom não deixou de existir. Mas tiveram que abrir espaço (e muito!) para tudo o que é ruim. O mercado cristão criou as celebridades evangélicas. A evangelização das pessoas deu espaço à conquista da nação. As tribos sucumbiram diante da massificação. E o gueto ficou pop. O que antes era mergulho cultural virou um verdadeiro naufrágio estético. A crise não se deteve à forma. Afetou também o conteúdo (ou virou falta de conteúdo).
No entanto, é possível observar que cerca de 15 anos depois a música evangélica vive um certo clima de reencontro e o “estilo” adoração voltou ao centro das atenções. A questão é que as circunstâncias e o contexto da Igreja mudaram. E em muitos momentos esse reencontro vem travestido de estratégia de marketing. Adoração é o que o povo quer, é o que o povo compra. Façamos adoração, portanto! Esse tipo de afirmação pode até ser dura. Mas o objetivo da crítica é que ela seja construtiva. A pretensão não é dar nome aos bois, pois quem além de Deus poderia fazer isso? A intenção é convidar o povo a observar que adoração não é um objeto de consumo. E convidar à reflexão aqueles que, em algum momento, tenham visto na adoração uma galinha dos ovos de ouro.
A questão aqui não é discutir aspectos mercadológicos do universo evangélico. Agora, precisamos reconhecer que o “selo” da adoração vende; que há uma crise na produção de música cristã contemporânea; e que declarações do tipo ‘adoração é um estilo de vida’ e ‘o Senhor procura verdadeiros adoradores’ estão virando mero clichê. Mas o que realmente preocupa não é que a música congregacional de adoração esteja crescendo e muito! Esse é o lado bom. O problema é quando ela vira apenas uma questão de estética e, na pior das hipóteses, de lucro.
Artigo extraído do site www.vineyardmusic.com.br