“Chegando-vos para ele, a pedra que vive, rejeitada, sim, pelos homens, mas para com Deus eleita e preciosa, também vós mesmos, como pedras que vivem, sois edificados casa espiritual para serdes sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por intermédio de Jesus Cristo.” (I Pedro 2.4,5).
Quaisquer que sejam as disputas que possam ter sido levantadas em relação à natureza da fé salvadora, isto é aceito por todos os mais virtuosos cristãos, e é essencial para o caráter de um cristão.
Estou pronto para professar, em conformidade com os grandes santos da igreja primitiva, de nossa própria igreja, e todos os protestantes, da Reforma e de muito tempo depois, que eu entendo por a dependência sobre a justiça e a morte de Cristo, como a plena satisfação da justiça de Deus para o pecado do mundo, na violação da sua lei, e o único fundamento de nossa aceitação para a recompensa da vida eterna. E se qualquer explicação sobre este ponto, agora tão ofensivo para muitos, deve ser exigida, a seguinte é humildemente submetida à consideração.
O pecado é a transgressão da lei do Deus Altíssimo; e a lei, no momento em que é quebrada, nos sujeita à sua pena. Disto, a punição do primeiro pecado cometido pelo primeiro homem é o mais memorável exemplo, e está registrado no início da Bíblia como a perpétua e mais importante lição para instruir a humanidade, em um ponto do qual, de outra forma, teriam sido ignorantes, e que, não obstante a forma solene em que ele está registrado, muitos estão aptos para ignorá-lo. Este fato deve ser particularmente observado, como projetado para nos dar uma visão clara da natureza de Deus e da natureza do pecado; e como sendo a chave para todas as descobertas posteriores das Escrituras. Porque, se o pecado de comer o fruto proibido não pôde ser perdoado, apesar de sua punição ter sido tão grande e em suas consequências, ter envolvido nele toda a descendência de Adão, podemos razoavelmente presumir que o pecado deve, em todos os casos, ter o mesmo aspecto aos olhos de um Deus imutável. “Ele é o mesmo ontem, hoje e para sempre”. Todo o pecado, portanto, como um ato de desobediência e rebelião contra ele, deve ser o objeto de seu descontentamento em todos os momentos, e será para sempre separada dele toda a alma do homem, no qual ela se achar não perdoada.
Se você não está disposto a admitir isso em relação à natureza do pecado e da natureza de Deus, como sendo contrário à idéia que você tem feito dele, e depreciando como você supõe a sua perfeição, então é sua incumbência provar, em que época, ou período do mundo, em que dispensação, ou nova descoberta relativa à vontade de Deus, e em que parte da Bíblia você achou isto registrado: que Deus tenha revogado o decreto contra o pecado, e fez uma mudança na lei dada ao homem em sua criação, da vida para a obediência, e da morte em caso de transgressão. A Escritura, ao contrário, em perfeita harmonia em todos os seus livros, nos revela que na segunda promulgação da lei, Deus apareceu na mesma majestade e santidade, e com a mesma denúncia de ira contra os pecadores, como ele fizera no início: “Maldito é todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para fazê-las.” Nisto, deve ser observado que mais do que a morte física ficou necessariamente implícita a ameaça e maldição feita pela lei aos israelitas – porque isso era inevitavelmente a condenação de toda a humanidade; se eles obedecessem ou não – por isso, naturalmente, nos sugere que a primeira ameaça: “No dia em que tu comeres certamente morrerás “, era da mesma extensão, da segunda, e o seu significado foi precisamente determinado por isto.
Nesta segunda frase, então, não há relaxamento da primeira. Não há qualquer declaração oposta sobre o caso de criminosos, nem a menor insinuação de qualquer mudança na vontade de Deus com respeito ao pecado. Na verdade, seria estranho se houvesse alguma; tal variação ou inconsistência no caráter de Deus declarada por si mesmo, seria um argumento de força muito maior contra a verdade da Bíblia do que qualquer outro que tenha sido alegado. O fato, então é certo: “O salário do pecado é a morte” e sempre será assim, enquanto Deus continuar o mesmo.
O que ele publicou e declarou na doação de seu primeiro pacto universal para toda a humanidade, na pessoa de Adão, ele renovou e confirmou pela entrega da lei a Moisés, que, como Paulo observa, “foi adicionada por causa das transgressões” (Gál 3.19), para que a apostasia deles possa ser conhecida, e “para que a ofensa abundasse” (Rom 5.20), em sua pena e maldição para a morte, agora mais uma vez solenemente concedida contra qualquer ofensor e cada ofensa.
Estas duas grandes manifestações da natureza e vontade de Deus, da hediondez e do grande mal do pecado, e da forma em que isto é tratado, é fartamente exemplificado nos julgamentos sobre os pecadores conforme registrado nas Escrituras. Muito impressionante e terrível verdade elas são, e aqui devemos cessar todo debate para sempre, a menos que quiséssemos carregar sobre nós, como muitos costumam presunçosamente fazer, a culpa do pecado das nossas próprias falsas noções nas quais, prescrevemos uma nova lei no lugar de Deus, para o alijarmos de sua soberania divina, para contestamos a sua sabedoria, e para destronamos a sua justiça.
Mas deixe a razão do homem, curta como ela é, ser o juiz nesta causa. O decreto é somente um que procede do Todo-Poderoso, e não foi revogada a revelação que ele fez de si mesmo: “Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas escritas no livro da lei, para fazê-las.” Suponha agora por um momento que nós temos a liberdade de alterar este decreto em questão, ou suprimir sua ameaça, fazendo provisão para um pecado. O que é este pecado? E, se para um, porque não para dois ou mais, e onde você vai parar? Se depois de tomar o direito de julgar a vontade de Deus, não haverá limite para você transgredir, não haverá temor disto, nenhum senso de bem ou de mal, nenhuma submissão ao governo e à autoridade de Deus, nenhuma obediência sobre a terra. A conclusão é evidente, se todos pecaram, todos serão levantados para a sentença de um Deus justo.
A conveniência da aliança de reparação do evangelho da graça, em que a misericórdia e a verdade se reúnem, a justiça e a paz se beijam, e Deus é justo e justificador daquele que tem fé em Jesus, está aqui evidente: e a necessidade de dependência da justiça e morte de Cristo é demonstrada a partir do relato anterior sobre a justiça inalterável de Deus, e da culpa do pecado, sendo o mesmo em todas as épocas do mundo. Uma coisa é necessária: nós devemos ser declarados livres de culpa, e investidos com uma justiça que nos levantará perante a lei da perfeição sem pecado, e nos dará o direito ao reino do céu. E se não tivermos isto em nós mesmos, onde acharemos isto, senão apenas, como existe na pessoa de Jesus Cristo? Dependemos portanto, desta justiça, como feita por ele para os crentes, e designada por Deus para os pecadores para nela confiarem, é a fé preciosa do Evangelho pela qual a alma é justificada diante de Deus. Como nenhum outro vai conciliar os atributos divinos, ou responder às exigências da humanidade, encerrada sob o pecado, e sempre pecadora; assim nada mais deve ser o fundamento da nossa esperança em Deus.
Nenhuma obra. Ai de mim! Não temos nenhuma – Não que suporte ser pesada na balança de Deus, ou que responda às exigências de sua justiça. Olhe, para o que você considera ser a melhor ação de sua vida, ou a mais excelente graça de sua alma; faça disto a sua pedra de toque; examine isto pela regra justa dos mandamentos, considerados em toda a sua extensão espiritual e como afeta o coração e todos os seus movimentos. Na matéria ou forma, no princípio ou fim, esteja certo de que você encontrará alguma falha grave, e condenação, em vez de recompensa. Deixe o judicioso e piedoso Hooker ser ouvido sobre este assunto: “Se Deus (diz ele) deveria nos fazer uma oferta assim tão grande, pesquise em todas as gerações de homens, desde a queda do nosso primeiro pai Adão, encontre um homem que tenha feito uma ação, que tenha sido pura, sem qualquer mancha ou defeito em tudo; e se para esta única ação de um homem, nenhum homem ou anjo deixará de sentir os tormentos preparados para ambos: você acha que esta libertação de homens e anjos poderia ser encontrada entre os filhos dos homens?”
Não, sinceramente. Isto foi recentemente adotado em nossa divindade, como se fosse a condição da graça da nova aliança, em oposição à lei da perfeita obediência. Mas isto não é mencionado como tal nas Escrituras. Assim, uma notável variação, em questão da maior importância, a partir de outras revelações que Deus fez de si mesmo e dos termos de nossa aceitação por ele, tinha necessidade de ser distinta e expressamente apontada.
Não é a nossa fé que justifica, (somos salvos pela graça, a nossa fé é imperfeita e não pode haver imperfeição na obra da justificação. Assim, a fé é apenas o meio e não o fim da justificação – nota do tradutor) e muito menos as nossas obras, e nem mesmo consideradas em conjunto para a nossa justificação, podem ambas fazer uma reivindicação de aceitação; as obras porque, são confessadas terem a natureza do pecado, por aqueles que chamam a ajuda da fé para se livrarem da sua imperfeição, não pode ser admitida qualquer participação em nossa justificação, e devem ser excluídas da ideia disto, porque o assunto deve ser tratado inteiramente em outro ponto, e a grande dificuldade ainda deve ser removida.
A justiça deve ser satisfeita, a lei deve ser cumprida, e em todos os nossos deveres o pecado se encontra misturado; e, a menos que se pudesse supor que a nova aliança é um relaxamento de cada exigência anterior, no que diz respeito ao julgamento de Deus do pecado, e que agora, nesta última era do mundo ele tem exibido a si mesmo com atuando sob uma dispensação de poder, e removendo o pecado de sua culpa, o nosso caso fica desesperado.
Mas ainda é um perigoso expediente, injustificado pela razão ou pelas Escrituras; e nós , portanto, cremos que “Sendo justificados pela fé, temos paz com Deus através de Jesus Cristo nosso Senhor.”, e que por meio disto seremos libertados da maldição da lei, porque a justiça de Cristo satisfez a justiça divina pela sua obediência até à morte, e, para o louvor da glória de sua graça, é imputada aos pecadores para a salvação. Esta é a âncora da alma, segura e firme, a nossa segurança total contra todos os medos, nossa primeira e única justificação.
A noção de uma segunda justificação está em oposição contra a verdade de Deus. Aqueles que adotam esta forma de pensamento não consideram que a justiça de Deus ainda existe em todo o seu rigor, porque a natureza de Deus e a natureza do pecado permanecem sempre o mesmo e, consequentemente, estaríamos perdidos para sempre, se a misericórdia do evangelho não se estendesse mais longe do que o primeiro benefício da remissão dos pecados, quando somos admitidos na aliança cristã. A fé não deve ser suspensa após o início da conversão, como uma coisa de nenhuma utilização posterior. “Somos justificados mediante a fé”, sua utilidade não é para ser experimentada apenas uma vez, mas sempre; em cada passo de nosso progresso, na hora da morte, e no dia do julgamento; na esperança, conforto, obediência aqui, e no céu para sempre.
Isto não significa que a fé tenha qualquer efeito em si mesma, ou que justifique meramente por uma obra ou nossa justiça própria. Não, ela consiste na negação do mérito de todas as obras, qualificações ou hábitos inerentes ao homem, e a essência do que é uma humilde submissão não fingida para como a justiça de Deus, como responsável ou dada a nós, e isto não vem de dívida, mas de graça. Isso pode fornecer uma resposta para aqueles que perguntam: Por que obras imperfeitas não podem justificar, bem como a fé imperfeita? Tenha como certo que uma não pode ser mais perfeita do que a outra. A razão disso é que a condição indispensável da justificação pelas obras, é a sua perfeição e, consequentemente uma reivindicação fundada sobre isto, ou deve ser compensada por uma obediência inteiramente sem pecado, ou então a esperança da salvação deve ser totalmente abandonada.
Considerando que a fé, embora possa ser fraca e imperfeita, em vez de se exaltar contra a justiça de Deus, e se levantar diante dele com uma confiança de mentira, coloca tudo de si mesma, e atribui a Deus toda a glória pela nossa salvação.
Parte inicial do prefácio do tratado escrito por Henry Venn sob o título: O Dever Completo do Homem, em domínio público, traduzida pelo Pr Silvio Dutra.