Era a noite fria de 3 de novembro de 2005. A minha esposa Kelly e eu estávamos subindo, emocionados, a Torre Eiffel, para avistarmos Paris do alto de um dos monumentos mais conhecidos do mundo. Estávamos comemorando 10 anos de casamento neste dia. Muito embora estivéssemos bem agasalhados e nos abraçando apertadamente, a nossa sensação de calor não vinha disso, mas da alegria de podermos dizer um ao outro que agora nos amávamos mais do que quando estávamos namorando, ou até mesmo de quando nos casamos!
Estávamos a caminho da Alemanha, onde pregaríamos, e Deus nos presenteou com esta passagem pela França, justamente numa data tão especial para nós! Oramos agradecidos a Deus pelo nosso casamento. Naquele momento, não pude deixar de lembrar-me dos muitos casais que atendemos ao longo desses mesmos dez anos pastoreando. Quantos deles declaravam que já não sentiam mais nada um pelo outro! Como é triste quando um cônjuge perde o amor pelo outro! Graças a Deus que muitos desses casais provaram um milagre celestial em seus relacionamentos! Muitos resgataram em Deus o amor que haviam perdido. Na mesma hora em que a minha mente divagava nessas recordações, eu também pensei como seria terrível eu perder o amor da Kelly e como era bom podermos constatar que o nosso relacionamento somente havia se fortalecido ao longo dos anos! Assim sendo, eu lhe fiz a seguinte promessa: “Vou te amar para sempre!”
É natural o nosso desejo de não somente amarmos, mas também de sermos amados em nossos relacionamentos. Também é natural a esperança de que isto não se acabe nem se corrompa. Eu creio que Deus quer que, sob o mesmo prisma, venhamos a entender a importância de amá-Lo da mesma forma. Por isso Paulo escreveu o seguinte aos efésios:
“A graça seja com todos os que amam a nosso Senhor Jesus Cristo com amor incorruptível.” (Efésios 6.24 – TB)
Temos aqui uma definição do tipo de amor que permite um livre fluir da graça do Senhor em nossas vidas. Algumas versões bíblicas empregam um termo diferente na tradução deste texto e usam a expressão “amor sincero” ou ainda “amor perene”. A Tradução Brasileira (SBB) e a Versão Revisada de Almeida (IBB) optaram corretamente pelo termo “incorruptível”.
O Dicionário Vine nos mostra que a palavra grega empregada nesse texto pelo apóstolo Paulo e que se encontra nos manuscritos originais é “aphtharsia”, que significa “incorrupção”. Esta palavra é usada com relação ao corpo da ressurreição (1 Co 15.42,50,53,54) e é uma condição associada à glória, honra e vida! Esta palavra às vezes é traduzida por “imortalidade” (Rm 2.7; 2 Tm 1.10) e também pode dar a idéia de “sinceridade”, de acordo com esta linha de pensamento. Por outro lado, a Concordância Exaustiva de Strong aponta dois prováveis significados para esta palavra: 1) incorrupção, perpetuidade, eternidade; 2) pureza, sinceridade. De qualquer forma, o amor puro e sincero é o que não se corrompe, que traz em si a perpetuidade, que dura para sempre!
A afirmação de Paulo aos efésios faz com que reconheçamos que há pelo menos dois diferentes tipos de amor que os crentes podem manifestar ao Senhor ao longo do tempo: o amor incorruptível e o amor corruptível. Portanto, quando falamos de amor ao Senhor, não basta apenas reconhecermos que há pessoas que O amam e pessoas que não O amam (1 Co 16.22). Se assim fosse, a nossa única tarefa seria a de fazermos com que os que não amam ao Senhor passassem a amá-Lo! No entanto, o nosso desafio é ainda maior! Até mesmo dentre os que hoje professam que amam ao Senhor Jesus Cristo, há os que O amam com um amor incorruptível e os que têm permitido que o seu amor por Ele se corrompa!
A CORRUPÇÃO ESTÁ LIGADA AO SER HUMANO
Infelizmente, desde o início do seu relacionamento com Deus, o homem tem mostrado que a corrupção está latente no seu ser. A corrupção faz parte da nossa própria natureza afetada pelo pecado e precisa ser mortificada através do domínio do Espírito Santo em nós.
Além da queda de Adão e Eva no Jardim do Éden, que demonstra claramente a inclinação do ser humano à corrupção, vemos nos dias de Noé que o Dilúvio foi um juízo divino provocado justamente por esta mesma corrupção dos homens:
“Viu o Senhor que a maldade do homem se havia multiplicado na terra e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração. Eis a história de Noé. Noé era homem justo e íntegro entre os seus contemporâneos; Noé andava com Deus. Gerou três filhos: Sem, Cam e Jafé. A terra estava corrompida à vista de Deus e cheia de violência. Viu Deus a terra, e eis que estava corrompida; porque todo ser vivente havia corrompido o seu caminho na terra. Então, disse Deus a Noé: Resolvi dar cabo de toda carne, porque a terra está cheia da violência dos homens; eis que os farei perecer juntamente com a terra.” (Gênesis 6.5,9-13)
Além do ocorrido nos dias de Noé, um dos exemplos de corrupção que mais me impressionam é o que aconteceu ao povo de Israel no deserto, logo depois que o Senhor os tirou do Egito com mão forte, sinais e prodígios! Moisés subiu ao monte para receber os Mandamentos e ouviu de Deus a seguinte afirmação:
“E o Senhor me disse: Levanta-te, desce depressa daqui, porque o teu povo, que tiraste do Egito, já se corrompeu; cedo se desviou do caminho que lhe ordenei; imagem fundida para si fez.” (Deuteronômio 9.12)
Estamos nos referindo a uma geração que viu a glória de Deus como nenhuma outra! O seu relacionamento com Deus mal havia começado e eles já haviam se corrompido! É triste reconhecermos a inclinação do homem à corrupção, inclusive em nosso amor ao Senhor. Essa geração deveria ter amado profundamente a Deus, mas esqueceram-se d’Ele bem depressa! Contudo, não estamos falando apenas de uma geração pertencente a um passado distante, pois este é o reflexo da nossa geração atual! Estamos repetindo o mesmo erro do passado!
O desafio de todo cristão é caminhar com Deus numa dimensão em que ele possa conservar o seu amor intocável, incorruptível. A Igreja brasileira vive um crescimento inédito. Nunca tivemos tantas conversões como vemos atualmente. As nossas igrejas nunca cresceram antes como crescem agora. Contudo, alguns dados estatísticos indicam que a quantidade de desviados em nosso país é quase a mesma que a de cristãos firmes! A proporção está quase de um para um!
Portanto, o nosso desafio não é apenas ganharmos os perdidos, mas também ensiná-los a amarem ao Senhor com um amor incorruptível!
A FONTE DA CORRUPÇÃO
Antes de querermos procurar os culpados, temos que admitir que a corrupção está ligada ao ser humano, à sua natureza carnal e pecaminosa. O apóstolo Paulo chamou esta condição interior de um “cativeiro da corrupção”:
“Pois a criação está sujeita à vaidade, não voluntariamente, mas por causa daquele que a sujeitou, na esperança de que a própria criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus.” (Romanos 8.20,21)
A palavra grega traduzida como “corrupção” é “phthora”, e, segundo a Concordância de Strong, significa: 1) corrupção, destruição, aquilo que perece; 2) aquilo que está sujeito à corrupção, que é perecível.
Em outras palavras, ela retrata algo que se estraga, que deixa de ser como era inicialmente, uma decadência. O pecado é uma fonte de morte, de corrupção, e este reconhecimento levou o apóstolo ao seguinte desabafo:
“Miserável homem que eu sou! Quem me livrará do corpo desta morte?” (Romanos 7.24 – RC)
A fonte de toda corrupção (inclusive do nosso amor corruptível para com o Senhor Jesus) encontra-se em nossa própria carne. É por isso que o crente em Jesus deve aprender a andar no Espírito, e assim mortificar a sua própria carnalidade. É tudo uma questão de escolhermos onde investiremos e o que fortaleceremos em nossas vidas:
“Não vos enganeis: de Deus não se zomba; pois aquilo que o homem semear, isso também ceifará. Porque o que semeia para a sua própria carne da carne colherá corrupção; mas o que semeia para o Espírito do Espírito colherá vida eterna.” (Gálatas 6.7,8)
O fato de termos em potencial uma fonte de corrupção em nós mesmos não significa que a corrupção seja inevitável! Não estamos fadados ao fracasso: temos uma escolha! Ao falarmos desta nossa inclinação carnal, estamos falando dos nossos desejos:
“No sentido de que, quanto ao trato passado, vos despojeis do velho homem, que se corrompe segundo as concupiscências do engano.” (Efésios 4.22)
A nossa carne carrega desejos enganosos, e não podemos nos entregar a eles. Pelo contrário, devemos nos despojar deles (de tudo o que fazia parte da antiga forma de vivermos). Esta é a única forma de não sermos vencidos pela corrupção da carne. É por isso que precisamos nos encher da Palavra de Deus. Ela é um poderoso instrumento de Deus para fazer com que andemos em vitória. Quando nos afastamos da Palavra, a corrupção certamente nos domina. Foi o que aconteceu nos dias de Neemias:
“De todo nos corrompemos contra ti, e não guardamos os mandamentos, nem os estatutos, nem os juízos, que ordenaste a Moisés teu servo.” (Neemias 1.7 – RC)
Apesar de carregarmos em nossa própria carne o que podemos chamar de uma fonte de corrupção em potencial, há ainda outros fatores externos que contribuem para aumentá-la.
A CORRUPÇÃO DO MUNDO
Todo cristão tem que enfrentar a força corruptora das paixões que há no mundo e aprender a não ser contaminado por elas:
“A religião pura e imaculada para com Deus, o Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e guardar-se da corrupção do mundo.” (Tiago 1.27 – RC)
A única forma de nos guardarmos desta força maligna de corrupção do mundo é enchendo-nos da Palavra (as preciosas promessas que o texto menciona) e da presença (natureza) divina – com o Espírito habitando em nós:
“Pelas quais nos têm sido doadas as suas preciosas e mui grandes promessas, para que por elas vos torneis co-participantes da natureza divina, livrando-vos da corrupção das paixões que há no mundo.” (2 Pedro 1.4)
Ao falarmos do mundo, estamos falando de um sistema que engloba muitas estratégias para se pressionar os cristãos. São hábitos, padrões, comportamentos, sem mencionarmos a força direta da mídia, que rege esses padrões e tenta massacrar os nossos valores. No entanto, no meio de todo este sistema, temos que nos manter em alerta, especialmente com relação às pessoas que nele vivem, pois a Bíblia declara que as más companhias corrompem os bons costumes:
“Não vos deixeis enganar: más companhias corrompem bons costumes.” (1 Coríntios 15.33 – TB)
Uma das coisas que este sistema, juntamente com as pessoas que nele vivem, tenta fazer é substituir o seu amor ao Senhor! É isso mesmo: ele não prega diretamente o abandono do nosso amor pelo Senhor; ele tenta fazer com que as pessoas amem as coisas deste mundo, e, desta forma, o amor por Jesus começa a esfriar (Mt 24.12)! Aí então, à medida que as pessoas passam a envolver-se com as coisas do mundo, elas vão se distanciando cada vez mais de Cristo! Foi isto o que aconteceu com um dos cooperadores de Paulo em seu ministério. Ele declarou o seguinte:
“Porque Demas, tendo amado o presente século, me abandonou e se foi para Tessalônica.” (2 Timóteo 4.10)
A Tradução Brasileira optou pelo termo “o mundo presente” neste texto. Este versículo nos mostra que a forma que Satanás usa neste sistema mundano para nos afastar do amor ao Senhor é tentando seduzir-nos com o amor ao mundo. A consequência imediata disto é o abandono, não só do discipulador, mas também do próprio Cristo. E esta progressão do nosso amor ao mundo não termina até que acabemos como inimigos d’Ele:
“Adúlteros, não sabeis que a amizade do mundo é inimizade contra Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo, constitui-se inimigo de Deus.” (Tiago 4.4)
Tiago chama os que se tornam amigos do mundo de “adúlteros”! Outra versão usa o termo “infiéis”, que significa exatamente a mesma coisa: “alguém que quebrou a sua aliança, o seu compromisso com o Senhor”! Por isso devemos guardar o nosso coração, para que ele não seja seduzido pelo amor ao mundo:
“Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele; porque tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai, mas procede do mundo. Ora, o mundo passa, bem como a sua concupiscência; aquele, porém, que faz a vontade de Deus permanece eternamente.” (1 João 2.15-17)
PROSTITUIÇÃO ESPIRITUAL
Tiago usou a expressão “adultério” ao referir-se ao cristão que dá as costas a Deus e envolve-se com o mundo. A Bíblia usa repetidas vezes expressões que indicam uma prostituição espiritual ao referir-se à corrupção do amor ao Senhor. Esaú é um exemplo negativo disto nas Escrituras. Ele tinha direito à herança de Abraão e Isaque por nascimento, mas desprezou-a e ficou conhecido como alguém que se prostituiu:
“E ninguém seja fornicador ou profano, como Esaú, que, por um manjar, vendeu o seu direito de primogenitura. Porque bem sabeis que, querendo ele ainda depois herdar a bênção, foi rejeitado, porque não achou lugar de arrependimento, ainda que, com lágrimas, o buscou.” (Hebreus 12.16,17 – ARC)
As Escrituras o chamam de “fornicador” e “profano”. De acordo com a Concordância de Strong, a palavra traduzida por “fornicador” é “pornos”, e significa: 1) homem que prostitui seu corpo à luxúria de outro por pagamento; 2) prostituto; 3) homem que se entrega à relação sexual ilícita, fornicador.
A Palavra de Deus emprega este mesmo exemplo de prostituição com relação a Israel, que deixou de amar e seguir ao Senhor:
“A mim me veio a palavra do Senhor, dizendo: Vai e clama aos ouvidos de Jerusalém: Assim diz o Senhor: Lembro-me de ti, da tua afeição quando eras jovem, e do teu amor quando noiva, e de como me seguias no deserto, numa terra em que se não semeia.” (Jeremias 2.1,2)
Deus compara o Seu povo a uma noiva e enfatiza que Ele Se lembrava do amor deles, antes que se corrompessem. E Ele continua empregando exemplos de prostituição na mensagem dada ao profeta:
“A tua malícia te castigará, e as tuas infidelidades te repreenderão; sabe, pois, e vê que mau e quão amargo é deixares o Senhor, teu Deus, e não teres temor de mim, diz o Senhor, o Senhor dos Exércitos. Ainda que há muito quebrava eu o teu jugo e rompia as tuas ataduras, dizias tu: Não quero servir-te. Pois, em todo outeiro alto e debaixo de toda árvore frondosa, te deitavas e te prostituías.” (Jeremias 2.19,20)
Novamente vemos os termos “infidelidade” e “prostituição” sendo usados. Quando permitimos que o nosso amor se corrompa e nos afastamos do Senhor, estamos praticando um “adultério espiritual”.
A Bíblia está repleta de pessoas que se corromperam em seu relacionamento com Deus: Esaú, Sansão, Saul, Uzias, Judas, e muitos outros. No entanto, quando olhamos somente para esses exemplos, associamos a corrupção do nosso amor ao Senhor somente aos casos mais graves, como o caso dos que se desviam totalmente. Pelo fato de não termos nos desviado, deduzimos que o nosso amor ao Senhor não está correndo o risco de corrupção, e, assim sendo, sentimo-nos confortáveis! Contudo, de acordo com o ensino do Senhor Jesus, há diferentes níveis de adultério:
“Ouvistes que foi dito: Não adulterarás. Eu, porém, vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, no coração, já adulterou com ela.” (Mateus 5.27,28)
Há um adultério “físico” e um adultério “do coração”. É lógico que o adultério “físico”, com o envolvimento sexual, tem consequências bem mais graves. Contudo, o adultério “do coração” não deixa de ser pecado e pode ser um passo para o outro nível de adultério. Alguém que esteja praticando o adultério “do coração” não pode gloriar-se de que está bem, ainda que a sua situação não seja visível, como a de quem cometeu um adultério “físico”. Semelhantemente, não adianta nos justificarmos, alegando que não estamos desviados! Se o nosso amor ao Senhor está se enfraquecendo, isto se deve ao fato de que, em algum nível, estamos nos corrompendo! Estamos adulterando!
Como eu já afirmei no Capítulo 2, a falta de amor ao Senhor é um pecado, é uma desobediência que será seguida de maldição! Portanto, precisamos nos arrepender e buscar ao Senhor, permitindo que Ele nos restaure. Na mensagem do profeta Jeremias, Deus revelou o Seu profundo amor pelo Seu povo, dispondo-Se a perdoá-los e a recebê-los novamente, ainda que eles tivessem se prostituído:
“Se um homem repudiar sua mulher, e ela o deixar e tomar outro marido, porventura, aquele tornará a ela? Não se poluiria com isso de todo aquela terra? Ora, tu te prostituíste com muitos amantes; mas, ainda assim, torna para mim, diz o Senhor.” (Jeremias 3.1)
Assim como o Senhor chamou o Seu povo de volta, perdoando-lhe a prostituição espiritual, Ele também está nos chamando de volta, independentemente do nível de corrupção que tenhamos permitido em nossas vidas! Ele quer nos restaurar! No entanto, mais do que sermos restaurados da corrupção do nosso amor ao Senhor, precisamos aprender a caminharmos de um modo tal a evitarmos que isto aconteça novamente!
Se aprendermos a amar a Cristo com um amor incorruptível, caminharemos de acordo com uma expressão maior da graça de Deus:
“A graça seja com todos os que amam a nosso Senhor Jesus Cristo com amor incorruptível.” (Efésios 6.24 – TB)
(Extraído do livro “DE TODO O CORAÇÃO – Vivendo a Plenitude do Amor ao Senhor”, de Luciano Subirá)